terça-feira, 31 de janeiro de 2012


O devastador crack

Como não poderia deixar de ser, o “crack” é a droga mais comentada na Imprensa brasileira. Depois do susto causado pela AIDS na década de 80, ele pode ser considerado a maior desgraça criada pelo homem visando enriquecimento. Mal que vem atingindo um número de pessoas cada vez maior e não se encontrou tratamento eficiente para livrar o usuário de sua dependência, que é fácil e rápida, mas a cura é difícil, lenta e sacrificante e sempre sujeita a recaída. Sabemos que há outros tipos de drogas ilícitas, mas não tão maléfica e epidêmica como o “crack” que vem afetando pessoas de todas as classes sociais, principalmente jovens, adolescentes e até crianças. O “craqueiro” se vicia facilmente e se torna um usuário compulsivo incontrolável. Transforma-se em verdadeiro zumbi. Não tem a mínima consciência do que seja vida social e familiar e, para obtenção da droga, faz qualquer coisa.
Vão da prostituição ao cometimento de graves crimes e até perdem a vida violentamente em razão do vício. São totalmente controlados pelo “crack’. Sabem que precisam de tratamento para parar, mas não conseguem dominar a compulsão. São destruídos em todos os sentidos. Precisam de ajuda, mas não a aceitam porque o poder da droga é maior e faz com que repilam qualquer auxílio. Diante de tal comportamento, ele deve ser considerado como portador de doença mental grave e de perigo social constante. Necessitando, assim, de tratamento hospitalar compulsório, uma vez que, geralmente, ele se recusa a fazê-lo. Na situação em que se encontra, deve ser considerando mental incapaz. Necessitando de recomendação psiquiátrica para efetivar a internação involuntária ou compulsória e local estruturado para tratá-lo. Em sendo menor, há duplo motivo para internação compulsória, uma vez que, além da incapacidade mental, há a incapacidade civil.
A Lei 10.261/2001 prevê a possibilidade de internação involuntária ou compulsória para tratamento de doença mental, onde a dependência química que causa perigo social, familiar e ao próprio doente pode ser enquadrada e o psiquiatra, com a assistência de pessoa da família do doente, pode recomendar tal internação. Contudo, como o poder público não dispõe, como deveria, de local estruturado para tratar tais dependentes, principalmente quando se trata de adolescentes, os mesmos são relegados à própria sorte. Em razão desse abandono por parte do poder público e haver muitos adolescentes nessa situação, o Ministério Público propôs várias ações civis públicas contra o Município e a Fundação Casa para que disponibilizem tratamento de drogadição compulsório aos necessitados. Da Fundação Casa pretendemos que o tratamento ambulatorial dos internos seja feito na própria entidade, aproveitando o período em que estão reclusos e em abstinência. É mais prático e eficiente do que levá-los aos deficitários postos de atendimento do SUS da cidade, expondo-os a constrangimentos perante usuários do sistema ao serem conduzidos algemados e uniformizados. Do município pretendemos que disponibilize tratamento voluntário aos que quiserem fazê-lo e, nos casos mais críticos, que proceda a internação compulsória. Infelizmente, o Município e a “Febem” procuram se eximir ou protelar tais obrigações. Ora as atribui a outrem; ora que não dispõe de verbas para tanto; montam local com estrutura inadequada para dizer que atende; ou simplesmente alegam que não tem na cidade lugar para efetuar tratamento compulsório. Estamos aguardando a Justiça decidir. Porém, entendemos que, as escusas do poder público são injustificáveis. Ele tem a obrigação de atender essa demanda. É direito do cidadão. Se a Justiça não exigir tal cumprimento com aplicação de multa pela inadimplência, os gestores nada farão para minorar o sofrimento dos necessitados. Não podemos ignorar o ardor da pimenta nos olhos dos outros porque não sentimos no nosso.
CLÁUDIO SANTOS DE MORAES
Promotor de Justiça da Infância e da Juventude de Rio Preto

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012


A grande festa.

O Carnaval, uma das festas mais populares do país, infelizmente evidencia um modelo bastante difundido e incentivado socialmente por aqui: o beber excessivamente
Artigo de Joaquim Melo para a Folha de S. Paulo
E, só para não perder o costume, as festas das principais cidades brasileiras estão sendo patrocinadas por grandes cervejarias. Empresas que, fornecendo uma série de aparatos para a realização dos eventos, têm como principal objetivo incentivar o consumo de álcool.
Para quem ainda duvida que o patrocínio de eventos culturais por fabricantes de bebida estimule o consumo, um bom exemplo é o último Rock in Rio.
A cervejaria apoiadora divulgou ter atingido o maior número de vendas da companhia mundialmente neste tipo de ação, comercializando 1, 7 milhões de copos de chopp. A marca reformou ainda o enorme sucesso com o público jovem público que, vale lembrar, por fatores físicos e psicológicos, é mais vulnerável a desenvolver dependência do álcool.
Como patrocinadoras, as fabricantes divulgam amplamente sua marca e estimulam livremente o consumo. Por isso, é no mínimo preocupante a posição do governo que, cedendo às pressões comerciais da Fifa, liberou a venda de bebidas alcoólicas nos estádios durante a Copa de 2014. Independentemente das regras estipuladas para o consumo, o pais aceitou transpor uma lei muito bem constituída e amplamente apoiada pela população em prol de uma marca de cerveja.
A decisão contraria o que se espera do poder público em seu compromisso de zelar pelo bem-estar e pela saúde dos brasileiros. Contaria também a expectativa de leis mais rígidas em relação à publicidade de bebidas alcoólicas.
Assim como já ocorre com o cigarro, proibir a propaganda de cerveja nos meios de comunicação é fundamental para moderar o consumo. As restrições à publicidade de cigarros e derivados do tabaco, por exemplo, reduziu a prevalência de fumantes na população de 32 % em 1989 para 19 % em 2006.

É uma medida essencial ainda para proteger os jovens. A publicidade é dos principais estímulos para o consumo do álcool entre crianças e adolescentes. Não por acaso, os comerciais de cerveja trazem mulheres bonitas, jovens de plásticas perfeitas, atletas e artistas consagrados. Tudo para reforçar os ideias de beleza e sucesso para quem consumir a marca da vez.
O patrocínio e a publicidade institucional também não ficam atrás. Eles respaldam a equivocada concepção do álcool como algo indissociável da organização social e cultural do país, com evidentes prejuízos para a população e para o sistema público de saúde.
No Carnaval, uma festa que já é associada à “bebedeira”, a situação é ainda pior quando fica evidente o apoio do poder público local a esse tipo de patrocínio.
As empresas oferecem recursos estruturais para o evento, e o Estado parece não ver uma oportunidade de se eximir da responsabilidade de proporcionar a infraestrutura adequada para comemoração.
É uma associação que, certamente, vai causar muitos prejuízos. Basta lembrar dos malefícios do álcool à saúde e dos mais variados tipos de violência relacionado ao eu consumo. Só no ano passado, durante o feriado de Carnaval ocorreram 2.411 mil feridos e 213 mortos nas estradas federais.
Considerando o enorme custo social do álcool para o país, é imprescindível uma legislação mais rígida com relação a publicidade de bebidas alcoólicas, restringindo inclusive o patrocínio de eventos culturais. A realidade é bem diferente de toda a alegria vista durante as comemorações. Definitivamente, cerveja não é confete de carnaval.
Joaquim Melo, 58, médico do trabalho e gastroenterologista, é presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead)

Consumo de energéticos dispara no país.

O consumo de bebidas energéticas disparou no Brasil nos últimos anos, com um crescimento de 25% só de 2010 para 2011, segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e Bebidas Não Alcoólicas (Abir), justamente num momento em que vêm à tona alertas sobre o aumento de hospitalizações relacionadas ao produto em pelo menos dois países. No Brasil, se a mistura da bebida com o álcool nas baladas já preocupava os médicos, agora o problema está na associação do produto a estilos de vida saudáveis.
Quem abusa desses compostos em busca de pique extra para aguentar uma agenda cheia demais pode colocar a saúde em risco. O médico Fábio Sândoli de Brito, da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), diz que mesmo o energético puro é capaz de fazer estrago no sistema cardiovascular. A bebida é contraindicada para pessoas que já têm problemas cardiovasculares. “Para esse grupo, existe o risco de arritmia, que leva a um risco de morte súbita”, diz. Um jovem saudável, que tome energético esporadicamente, provavelmente não terá problemas. “Mas pode ser que um homem de 45 ou 50 anos tenha um desempenho físico acima de sua competência física e passe a entrar em risco.”
O executivo Paulo Vidal, de 53 anos, por exemplo, usa os energéticos para dar conta da academia depois de uma jornada cansativa de trabalho. “Malhar depois de um dia inteiro no trabalho não é fácil. Sinto que o energético dá mais ânimo. É uma opção para dar uma revigorada, me manter acordado e animado”, conta. “Faço esteira, bicicleta, alongamento e musculação. E corro uma ou duas vezes por semana”, completa. Ele diz que recorre ao produto quase todos os dias, há cinco anos, mas passou a usar a versão em cápsulas em vez do líquido porque seu corpo reclamou. “Comecei a ter queimação no estômago.”
A maioria dos médicos critica o abuso do produto, contraindicado para vários grupos populacionais, sob o risco de ocorrências cardiovasculares, gastrite, desidratação e dependência. Mas há nutricionistas que defendem a bebida, especialmente para pessoas como Vidal, que trabalham o dia todo e querem treinar na academia no fim do dia. Esse é o caso de Tatyana Dall’ Agnol, especialista em nutrição e metabolismo pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
“Existe muita lenda a respeito do energético. Ele tem cafeína, que é o mesmo composto que tem no cafezinho, e taurina, que é um aminoácido que ajuda na desintoxicação do corpo”, garante.

Em um ponto, porém, todos os especialistas concordam: misturar energético a bebidas alcoólicas é arriscado. O pesquisador Sionaldo Eduardo Ferreira, professor de Educação Física da Unifesp, afirma que o energético não é capaz de reduzir os efeitos tóxicos do álcool. E pior: pode estimular o indivíduo a consumir uma quantidade maior de bebida alcoólica. Em seu doutorado, estudou os efeitos do álcool com energéticos em camundongos.
“Enquanto os camundongos que receberam só álcool ficavam prostrados, os que receberam a combinação ficavam hiperexcitados. Isso nos leva a crer que o sujeito pode ficar embriagado, mas achando que está bem. A excitação leva a um erro de julgamento”, diz.
Combinar álcool com energéticos se mostrou uma prática comum entre os jovens brasileiros em um levantamento feito pela Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas (Senad), em 2010. A pesquisa concluiu que 74,3% dos quase 18 mil estudantes ouvidos já experimentaram a mistura.
“Com essa combinação o jovem fica mais ativo, apesar do álcool. Eles sabem do risco, mas pensam: ‘Até pode ser ruim para os outros, mas eu sou mais forte do que isso. Para mim, não vai ter problema’”, diz o psiquiatra Arthur Guerra de Andrade, presidente do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa) e um dos organizadores da pesquisa da Senad.
Andrade acredita que a mistura com o álcool é cada vez mais frequente e tem apelo sobretudo entre os mais jovens. Enquanto 88,8% dos universitários de até 18 anos pesquisados relataram já ter usado energético com álcool, para os com 35 anos ou mais a taxa foi de 47,3%.
MARIANA LENHARO
Banir o crack é utopia’.

Jefferson Ribeiro critica falta de recursos e de policiais e diz que recuperação total de usuário é ‘praticamente impossível’
Um belo dia toca a campainha do secretário interino de Justiça de Brasília, Jefferson Ribeiro. É o vizinho, pedindo que o Ribeiro prenda o filho viciado em crack, de 17 anos, que roubara uma bicicleta para comprar a droga. “Vi o garoto crescer”, conta o secretário. “Ele estava transtornado, em crise de abstinência. Não tinha nada para pegar em casa, catou a bicicleta e a entregou por uma pedra de crack na esquina”.
Em vez de prender o rapaz, Ribeiro o convenceu a ser internar em uma clínica de tratamento para dependentes químicos, onde está há seis meses. Casos de abuso da droga como o do vizinho de Ribeiro são exemplares da disseminação do crack na capital, desde que as primeiras pedras de foram apreendidas, há dez anos.
“Banir (o crack) é impossível, é utopia”, crava Ribeiro. “Queremos ao menos minimizar, frear, prender os traficantes e ter êxito em trazer os jovens para o tratamento”. Segundo o secretário, o tráfico da droga já atinge 12 das 31 unidades administrativas do Distrito Federal.
Ele atribui a dificuldade de se combater o crack, entre outros motivos, à falta de recursos. Em 2011, a Secretaria de Justiça (Sejus) só teria investido R$ 1 milhão no combate à droga. “Foi uma decepção até porque não tínhamos um orçamento elaborado pelo governo atual”.
“Este ano adequamos o nosso orçamento e vamos poder investir tanto prevenção quanto no tratamento e na repressão”, assinala. Ribeiro nega que haja tolerância por parte da polícia no combate ao tráfico. Mas destaca que há um número insuficiente de policiais atuando nas ruas, que deve ser parcialmente resolvido com a formatura de 1.200 PMs este ano.
“A polícia não tem sido suficiente para inibir totalmente”, diz. “A situação é crítica? É. Não quero atenuar a situação. Mas não temos ainda uma situação como a de São Paulo, a realidade não é essa. Mas é preocupante. Se não tomarmos ações enérgicas podemos chegar a este estágio, tenho plena convicção disso”.
Ribeiro conta que os primeiros registros do crack no Distrito Federal datam de 2002, na cidade satélite de Ceilândia. Em 2006, a droga já havia se espalhado pelas cidades de Taguatinga e Gama e, no ano passado, a região central de Brasília – onde funciona sede do poder político e a principal área comercial da capital – se firmou como a maior área de atuação do tráfico.
“Fomos surpreendidos”, conta o secretário. “O governo do Distrito Federal (GDF) nunca esperou que o crack fosse ter essa proporção de hoje. Imaginávamos que fosse uma questão local, pontual. As pesquisas sempre apontaram a maconha como a droga que é 'xodó' da turma. Não esperávamos que o crack fosse crescer tão assustadoramente”.
Para tentar conter o avanço da droga, o GDF lançou, há quatro meses, um plano de combate ao crack, que está sob a coordenação da Sejus. Em 2012, o orçamento previsto para o programa, que envolve 15 secretarias, é de R$ 46 milhões. As ações envolvem prevenção, tratamento dos dependentes químicos e repressão policial ao tráfico da droga.
“É a primeira vez que se adota um plano desta magnitude no Distrito Federal. O governo Agnelo Queiroz é pioneiro nisso”, sustenta Ribeiro. “Já visitamos 79 escolas, demos palestras para mais de 40 mil alunos, distribuímos cartilhas, fizemos campanhas educativas, publicitárias, busdoor, outdoor”.
Mas quantos viciados, neste período, foram totalmente recuperados? “Nenhum”, admite o secretário. “Nós conseguimos mantê-los em tratamento, mas a recuperação total de um dependente químico é praticamente impossível. Qualquer vacilo é porta aberta para esse cidadão voltar ao mundo das drogas”.
Plano bilionário
Segundo o secretário, apenas 30% dos usuários da droga concordam em se submeter à desintoxicação. “A cada dez usuários de crack, quatro não sobrevivem, três não conseguem fazer o tratamento e só três são permanecem no tratamento. É um percentual bem aquém do que pretendemos alcançar”, reconhece.
As ações do GDF servem de complemento ao plano lançado em dezembro pelo governo federal, que prevê gasto de R$ 4 bilhões no combate ao crack em todo o País. Brasília foi escolhida como responsável por presidir a comissão que definirá as ações que nortearão o programa.
“A expectativa é muito boa. Pela primeira vez estou vendo a vontade do governo federal em trabalhar de forma integrada com os estados. Mas entendemos que só com o envolvimento de toda a sociedade, juntamente com o poder público, é que vamos ter um efeito”, conclui Ribeiro.

Fred Raposo







Jogada de marketing faz o crack virar oxi.

Para especialistas, status de novidade da “nova” droga não passa de estratégia dos traficantes para atrair mais usuários

Propagada como a mais nova droga do mercado, o oxi vem sendo encarado pelas forças de segurança brasileiras como apenas uma estratégia do narcotráfico para ampliar as vendas e seduzir novos consumidores. É o que comprovam estudos feitos por peritos criminais da Polícia Federal (PF). “O que percebemos é que o oxi é apenas uma derivação da cocaína, um estágio anterior ou posterior ao crack, que não passa de uma jogada de marketing dos traficantes”, ex plica o chefe da perícia da PF no Paraná, Silvino Schlickmann Júnior. O que se sabe, de fato, é que o oxi tem efeitos ainda mais destrutivos que o crack e é produzida principalmente no Peru e na Bolívia.

Uma análise criteriosa de 23 amostras de cocaína e de 20 amostras do suposto oxi apreendidas no Acre, feita no ano passado por peritos da PF, pôs em xeque a afirmação de que esta se trataria de uma nova droga. O estudo indica que formas de apresentação típicas da cocaína, como sal, crack e pasta base, vêm sendo erroneamente classificadas como oxi.
Os peritos federais Adriano Maldaner e Ronaldo Carneiro Júnior, principais autores do trabalho, destacaram que ficou claro não haver quantidades significativas de cal (óxido de cálcio) e de hidrocarbonetos (como querosene ou gasolina) nas amostras analisadas. “Os resultados não confirmam a informação de que quantidades significativas dessas substâncias teriam sido utilizadas na formulação de uma nova droga. Trata-se apenas de uma nova composição”, afirma Mal daner.
De acordo com as análises, portanto, os usuários estariam consumindo diretamente pasta base (sem refino) e cocaína base (refinada) com elevados teores de pureza, acima de 60%, o que pode contribuir para agravar os efeitos estimulantes e psicotrópicos e aumentar a possibilidade de overdose. Quanto ao preço, mais baixo que o da cocaína em pó e até mesmo do crack, seria uma forma de viciar os consumidores mais rapidamente e assim ganhar mercado.
Entre maio e julho do ano passado, pelos menos seis apreensões da “nova droga” foram feitas no Paraná, totalizando 13,7 quilos. A droga apreendida, no entanto, não passou por testes conclusivos para ser classificada como oxi. Para constar como prova no inquérito policial aberto contra acusados de tráfico de drogas – independentemente do entorpecente com que foram flagrados –, as amostras são encaminhadas para análise no Instituto de Criminalística do Paraná, em Curitiba. “O que fazemos é apenas verificar se a amostra contém a substância ativa, neste caso a cocaína, considerada ilícita, não a sua concentração, composição ou efeitos sobre os usuários”, explica a perita do Laboratório de Química Legal Luciane Rocio de Lara França.
Para os órgãos federais, saber se essa pretensa nova droga está chegando ao país deve ser uma preocupação relativa à segurança nacional. Por se tratar de um crime muitas vezes internacional, a comprovação da existência de uma nova droga aciona o setor de inteligência, responsável por rastrear fornecedores e desvendar a logística de distribuição, explica Schlickmann Júnior.

FABIULA WURMEISTER

Traficantes usam imagem de jogadores de futebol para fazer "marketing" do crack no Rio
Na tentativa de maximizar os lucros ou supostamente associar à droga uma imagem de "qualidade", os traficantes da principal facção criminosa do Rio de Janeiro passaram a adotar uma estratégia de marketing para impulsionar o comércio de crack e outros entorpecentes nas favelas da capital fluminense: embalagens que estampam rostos de ícones midiáticos, em especial jogadores de futebol. Reportagem do UOL mostrou ontem que antes visto como "coisa de paulista", o crack garante atualmente lucro para traficantes no Rio.
No dia 11 de janeiro desse ano, operação em uma cracolândia do Rio apreendeu papelotes de crack com a foto do jogador Ronaldinho Gaúcho
Antes visto como "coisa de paulista", crack garante lucro para traficantes do Rio
A escolha dos "garotos-propaganda" do narcotráfico é feita de acordo com os valores unitários dos entorpecentes. Na favela de Manguinhos, por exemplo, onde fica uma das principais cracolândias da zona norte da cidade, o crack mais barato –que sai a R$ 5 nas bocas de fumo próximas aos acessos à comunidade–, ainda é personalizado com a imagem do atacante Adriano.

De acordo com a presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e Outras Drogas (Abead), Analice Gigliotti, os narcotraficantes realmente acreditam que a associação da droga com pessoas famosas é capaz de aumentar os lucros. No entanto, o sucesso crescente do crack estaria ligado principalmente aos preços mais baixos, e não necessariamente a uma ação de marketing.
"Todos, inclusive os traficantes, sabem que o rosto de um famoso é capaz de aumentar a venda do produto. Seja maionese, calcinha ou supermercado, é claro que essa associação pode trazer bons resultados. Isso não significa, claro, que essas celebridades estão endossando o uso do crack ou de qualquer outra droga. O que aumenta mesmo o consumo é o preço do crack", afirma Gigliotti, que também é chefe do setor de dependência química da Santa Casa de Misericórdia do Rio.
A imagem do "Imperador", que passou pelo Flamengo e que atualmente integra o elenco do Corinthians, é uma das mais utilizadas pelos traficantes do Comando Vermelho (CV) desde que a facção introduziu a ideia no cenário mercadológico do crime organizado. A mesma estratégia já foi adotada por traficantes das comunidades da Cidade Alta e do Jacarezinho, ambas na zona norte, e de várias outras favelas.
Segundo informações do 16º BPM (Olaria), os criminosos utilizavam uma técnica simples de impressão para reproduzir a imagem do jogador, que aparecia em uma foto de péssima qualidade vestindo a camisa da Internazionale de Milão, clube pelo qual se destacou no futebol italiano.
No mesmo período, nas favelas de Manguinhos e do Jacarezinho, as embalagens de pedras vendidas a R$ 10 exibiam a imagem do ex-jogador Ronaldo, que hoje é membro do comitê organizador da Copa do Mundo de 2014, no Brasil.
Se no mercado publicitário os ícones midiáticos são constantemente substituídos, a mesma lógica foi incorporada pelo tráfico de drogas.
Quando o atacante Adriano deixou o Flamengo, em 2010, já em fase de declínio na carreira, e Ronaldo anunciou sua aposentadoria, no ano seguinte, os criminosos começaram a buscar outros personagens.

O volante Willians, destaque do Flamengo na conquista do Brasileirão de 2009, foi o escolhido por traficantes do Arará, no complexo de Manguinhos, para ser o garoto-propaganda da embalagem de crack mais cara, a de R$ 25. Em uma operação realizada pela PM em agosto do ano passado, foram apreendidas cerca de 5.000 pedras de crack com a imagem do jogador.
Já em 2011, a bola da vez no mercado publicitário do crime organizado foi o atacante Ronaldinho Gaúcho, também do Flamengo. Já foram apreendidas pela polícia embalagens de crack com a foto do "R10" em pelo menos três favelas da capital fluminense, principalmente no Jacarezinho –nas quais ele estampava a embalagem da pedra vendida a R$ 10.
Um agente do 22º BPM (Maré) afirmou ao UOL que durante uma incursão para reprimir o tráfico em Manguinhos, os policiais localizaram em um imóvel abandonado vários adesivos rosas com a inscrição "Ronaldinho Gaúcho, o melhor crack do mundo". O decalque estava em meio a um farto material utilizado para "endolar" o crack. Na comunidade, o entorpecente que exibe a imagem do atacante flamenguista é vendido a R$ 5.
Qualidade gráfica
Na última operação realizada pela Secretaria Municipal de Assistência Social (Smas) na cracolândia do Jacarezinho, há quase duas semanas, policiais civis encontraram 42 envelopes de crack com a imagem de Ronaldinho.

A qualidade da reprodução da imagem do atacante flamenguista, pela qual se nota a preocupação em criar uma identidade visual do produto, mostra que os traficantes estão investindo cada vez mais nesse tipo de associação.
Segundo a polícia, a iniciativa se dá não só pela popularidade do esporte, mas pela semelhança fonética entre “crack”, o entorpecente, e o adjetivo “craque”, utilizado para rotular os jogadores acima da média.
"Tática é antiga"
De acordo com a ex-chefe de inteligência da Polícia Civil do Rio, Marina Maggessi, a estratégia de marketing do narcotráfico carioca é utilizada desde o início dos anos 2000, quando a facção Comando Vermelhou passou a demonstrar publicamente sinais de identificação com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).

"Essa tática é antiga, eles sempre fazem isso. Há muito tempo atrás, os traficantes do CV diziam que o crime no Rio tinha ligações com as Farc, por exemplo. Mas eles nem sabiam o que significava isso. Apenas carimbavam no papelote e saíam por aí dizendo que eram parceiros das Farc. Todas as favelas tinham o carimbo, é uma estratégia", explica.
Maggessi lembra que a moda se popularizou com rapidez depois que os criminosos do Comando Vermelho passaram a utilizar a imagem de Osama bin Laden, ex-líder terrorista morto no ano passado pelo Exército americano.
"Toda vez que a mídia anunciava uma apreensão de cocaína com a imagem do Osama bin Laden, era publicidade para eles [traficantes]", disse.
Desde o atentado ao World Trade Center em Nova York, em 2001, a principal facção criminosa do Rio passou a utilizar a imagem e o nome de Osama bin Laden como o pioneiro de uma estratégia de marketing que incluía não só a personalização das embalagens de drogas, mas a divulgação de músicas funk (os chamados "proibidões") que exaltavam tal associação.
No funk "Comando Vermelho da Unidos do Borel", de autoria de MC Frank (que foi preso no fim de 2010 sob acusação de apologia ao crime e ao tráfico de drogas), há versos que homenageiam o líder terrorista, tais como "Um monte de homem-bomba estilo Osama bin Laden" (em referência à postura dos integrantes da quadrilha nos confrontos com policiais e criminosos rivais) e "Borel é vários bicos, tipo Afeganistão".
A favela do Borel está situada no bairro da Tijuca, na zona norte, e atualmente conta com uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP).
Outros famosos
Imagens de ícones midiáticos como a cantora inglesa Amy Winehouse –morta no ano passado– e a atriz Vera Fischer também já foram utilizadas pelo narcotráfico carioca. Ambas já tiveram problemas com o uso de drogas e passaram por clínicas de reabilitação.

Em agosto desse ano, a PM apreendeu durante uma incursão na favela de Manguinhos mais de cem papelotes de cocaína com a inscrição "Amy House", em alusão ao nome da artista inglesa. Os envelopes contavam ainda com uma foto colorida da cantora.
Segundo informações do 22º BPM (Maré), o objetivo dos criminosos seria criar uma ideia de que a cocaína comercializada em Manguinhos teria uma "qualidade melhor" em comparação com as favelas concorrentes.
A imagem de Vera Fischer também foi utilizada com o mesmo propósito no mesmo período da operação em Manguinhos. A atriz, que começou a usar cocaína depois dos 30 anos, foi internada em uma clínica de reabilitação em julho do ano passado. Os criminosos aproveitaram a repercussão em torno do drama pessoal de Fischer e a transformaram em garota-propaganda da droga.
"Traficante também lê jornal", disse a ex-chefe de inteligência da Polícia Civil, Marina Maggessi.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012


Álcool: vilão para a família e para o comércio.

Lei Antiálcool multa dezenas de estabelecimentos e tenta evitar que histórias como a de Paulo se repitam.
Um gole de álcool e o fundo do poço. Quem bebe pela primeira vez não associa a cerveja, por exemplo, à destruição da família e do futuro e  que a bebida pode levar ao vício de outros entorpecentes.
Uma pesquisa do governo estadual aponta que 18% das pessoas entre 12 e 18 anos bebem regularmente. Outra revelação é que quatro a cada dez menores de idade compram bebidas alcoólicas nos estabelecimentos comerciais.
Para impedir a venda e o consumo a  menores, foi criada a Lei Antiálcool. Em dois meses, 34 estabelecimentos foram multados em Sorocaba, segundo a Secretaria Estadual de Saúde.
O comerciante tem de pedir o documento de identificação ao consumidor para realizar a venda ou deixar que o produto seja consumido no local.
Aos 13/ O mesmo estudo mostra que o consumo de álcool começa, em média, aos 13 anos, mesma idade em que Paulo (nome fictício), 25, tomou o primeiro porre.
Ele relata que a sua porta de entrada para o vício das drogas foi a bebida. Só percebeu que estava doente depois que perdeu a namorada e começou a vender as roupas que vestia. “A primeira vez que experimentei cerveja foi na infância. Tinha uns 8 anos. Foi meu pai quem me ofereceu. Aos 13, fiquei bêbado com destilados”, conta.“Para mim, bebida era sinônimo de alegria. Meus amigos e eu nos reuníamos aos fins de semana para encher a cara.”
Aos 17, Paulo estava viciado em maconha, cocaína e crack. “Eu achava que podia controlar a vontade, mas o corpo pedia mais droga”, afirma.
A procura por ajuda ocorreu quando o rapaz não tinha mais controle da sua vida. “Primeiro a gente nega que tem o vício, mas percebe que tudo está fora de controle. Não rende no serviço, quer trocar tudo que tem por droga e causa sofrimento à si e à família”, detalha.
Há dois anos ele está “limpo”. Nunca ficou internado em uma clínica de recuperação e participa de reuniões em grupos de apoio quatro vezes por semana. “Eu nunca poderei voltar a beber, pois o corpo não diferencia o tipo de droga consumida”, diz. “Para o resto da vida terei de fazer tratamento. Hoje, graças a Deus, consigo me controlar.”
Família/ De acordo com a psiquiatra  Maria Clara Schnaidman Suarez é a família quem incentiva o uso de bebida alcoólica. “O pai ou a mãe dá a desculpa que a criança ficará com vontade, então molha a chupeta na cerveja”, descreve os casos mais comuns. “Não dá para descobrir quem tem pré-disposição a ser dependente.”
A psiquiatra diz ainda que a primeira droga a ser experimentada é o álcool, seguido da maconha. “Ninguém atribui à bebida alcoólica à dependência porque ela é lícita”, explica. “A melhor coisa é evitar o primeiro gole ou trago.”
Diálogo é o melhor caminho
As curiosidades surgem na adolescência. Pais contam que usam a conversa para orientar

Apesar da fiscalização em bares, lanchonetes e restaurantes pela Lei Antiálcool, os pais de adolescentes se preocupam com o bem-estar dos filhos quando eles saem para se divertir. “A educação começa dentro de casa. Sempre oriento meu filho a não ingerir bebida alcoólica”, diz a professora Márcia Garibaldi Barreto, 58 anos. “Longe dos nossos olhos fica difícil creditar a confiança nos estabelecimentos, pois alguns podem descumprir a legislação.”
Seu filho, o estudante Lucas Garibaldi, 17, revela que já experimentou bebidas alcoólicas, mas não gostou. Por isso, quando sai deixa a mãe despreocupada. “Detesto o sabor e quando vejo meus amigos passando por vexames por causa da bebedeira, tenho mais certeza que não quero isso para mim”, afirma.
A psiquiatra Maria Clara Schnaidman Suarez orienta que a família é quem deve dialogar com os adolescentes e alertar sobre os riscos que o vício pode causar à saúde.
A dona de casa Neuci Andrea Rodrigues Pereira, 51, por exemplo, tem esse tipo de conversa com a filha, Andrea, 17. “Como ela tem diabetes, lembro que  não pode beber.”
A moça relata que também nunca teve curiosidade de experimentar.
“Digo à ela que, se tiver vontade, pode tomar. Se disser que não pode, sei que isso vai aguçar a vontade”, conta a mãe.

De olho/ Conforme a  Vigilância Sanitária de Sorocaba, os resultados da Lei Antiálcool na cidade apontam que o trabalho de fiscalização é eficaz. “A legislação quer evitar a ingestão precoce, nociva e perigosa de bebidas alcoólicas por crianças e adolescentes, pois  pode causar dependência, doenças, problemas familiares, violência, acidentes e mortes”,  diz a diretora da Vigilância Sanitária, Maria Cristina Megid.
Mesmo acompanhados dos  responsáveis, menores de idade não podem comprar ou ingerir bebida alcoólica em estabelecimento comercial.

Tatiane Patron



Psiquiatra aponta prescrição indiscriminada de ansiolíticos no país.

Prescrição indiscriminada e uso excessivo podem ser algumas das explicações para o alto consumo de ansiolíticos, remédios usados para controlar ansiedade e tensão. A avaliação é do psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira, coordenador do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Dados divulgados nesta sexta-feira (20) pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) mostram que os ansiolíticos foram os medicamentos com receita controlada mais consumidos no país entre 2007 e 2010. O princípio ativo clonazepam, base do remédio Rivotril, lidera o ranking, com cerca de 10 milhões de caixas vendidas somente em 2010.
Segundo o psiquiatra, os ansiolíticos têm sido indicados por profissionais de diversas áreas. “Sabemos que médicos de várias especialidades prescrevem esses remédios, sem necessariamente ser psiquiatras. Não há restrição, mas é como se eu [psiquiatra] passasse a receitar antibiótico. Não sou a pessoa mais adequada”, diz Silveira.
O psiquiatra citou pesquisa feita em 2011 pela Unifesp, segundo a qual os ansiolíticos, conhecidos como calmantes, correspondem a 35% dos medicamentos psiquiátricos prescritos nos hospitais gerais da cidade de São Paulo.
Este não é, porém, o único fator que pode explicar o boom dos calmantes no Brasil, ressalta Silveira. O uso descontrolado também está entre os fatores. É cada vez mais comum recorrer aos tranquilizantes para enfrentar o estresse e as dificuldades da vida cotidiana. O pior é esse tipo de remédio provoca dependência. “As pessoas tendem a buscar uma pílula mágica para lidar com os problemas”, diz o médico.
De acordo com Silveira, das 600 consultas mensais feitas pelo Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Unifesp, 50 são de pessoas viciadas em calmantes. A princípio, a maioria usa o remédio com indicação médica. Depois, passa a querer doses maiores e acaba partindo para a compra ilegal.
Para Dartiu Silveira, o melhor monitoramento do consumo dos ansiolíticos no país reflete também os números elevados. Atualmente, o Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC) da Anvisa têm cadastradas 41.032 farmácias e drogarias, equivalente a 58,2% do total dos estabelecimentos autorizados pela agência reguladora a vender medicamentos controlados.

Cracolândia: uma terra sem pai.

No jogo político de empurra, a discussão sobre soluções para a explosão do consumo do crack no país e o combate ao uso da droga mais devastadora das últimas décadas descamba para o discurso simplista: a busca por culpados
O crack virou o assunto da vez nos primeiros movimentos da corrida eleitoral à prefeitura de São Paulo. A discussão ganha destaque desde a operação de repressão ao consumo da droga na Cracolândia, iniciada no último dia 3. E tem contornos eleitorais cada vez mais definidos.
Enquanto políticos empurram a paternidade do problema uns para os outros e não apresentam soluções efetivas para conter a explosão da droga, especialistas afirmam que não há como apontar um único responsável. A ausência de dados e registros oficiais dificulta ainda mais a compreensão exata do problema.
"Não existe um culpado pela Cracolândia. Não dá para dizer que é culpa de uma única gestão, porque todas foram negligentes e não souberam enfrentar o problema", resume o psiquiatra e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Marcelo Ribeiro.
 Na última segunda-feira, um dos pré-candidatos do PSDB, Andrea Matarazzo, acusou o PT de "consolidar" a Cracolândia em São Paulo. "O PT consolidou o crack na região da Luz durante os anos de gestão deles na prefeitura e hoje vem reclamar que está sendo feito tudo errado", disse Matarazzo, em uma alusão à administração Marta Suplicy (2001-04). O PT joga a culpa nos tucanos, que, na visão do partido, abandonaram os projetos de revitalização do Centro na gestão José Serra (05-06).
 A nova operação na Cracolândia gerou controvérsia entre estudiososos e serviu de munição para troca de farpas no meio político. O pré-candidato do PT à prefeitura, Fernando Haddad, por exemplo, chegou a tachar a ação de “desarticulada” e “desastrada”. Enquanto o prefeito Gilberto Kassab (PSD) defendia a operação, chegou-se a falar que a ação, mais do que desmantelar a ação de criminosos que alimentam o vício de usuários, teria pretensões políticas - ofuscar uma futura empreitada do governo federal, que poderia usar isso como trunfo na campanha eleitoral deste ano.
 Expansão – Divergências políticas à parte, o que interessa é que nem mesmo o governo federal conseguiu mapear de forma real a expansão do crack - a droga mais devastadora das últimas décadas - e apresentar soluções efetivas para erradicar a droga, que se alastrou pelas capitais de forma avalassadora e chegou aos rincões do país. O Plano de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas, lançado com pompa pela presidente Dilma Rousseff em dezembro de 2011, ainda não foi colocado em prática. Uma pesquisa que promete expor a dimensão do crack no país, encomendada pelo Ministério da Justiça à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), ainda está em fase de conclusão.
 O principal levantamento sobre o consumo de crack, feito no ano passado pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) em 4.430 das 5.565 cidades brasileiras, revelou que há consumo da droga em 91% delas. A pesquisa, porém, não traz uma evolução histórica da presença do crack e carece de informações de capitais importantes, como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.
 Os dados mais antigos sobre o crack no Brasil remetem ao início da década de 2000 e não trazem números específicos sobre São Paulo. Uma pesquisa encomendada pelo governo federal ao Centro Brasileiro de Informações Sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em 2005, mostra um consumo discreto e estável na população brasileira entre 2001 e 2005. De acordo com o Relatório Brasileiro sobre Drogas, feito pelo Ministério da Justiça em 2009, há evidências de que a partir de 2005 o consumo do crack cresceu vertiginosamente, porém não há números que comprovem essa constatação.
 Cracolândia – O surgimento de uma área de uso do crack em São Paulo é o desdobramento mais recente de um longo processo de deterioração do Centro da cidade, iniciado ainda na década de 1950.
 A concentração dos “crackeiros” foi um processo natural, uma vez que o alto grau de dependência da droga exige um local onde o poder público não está presente. “As zonas abandonadas foram escolhidas por viciados em todas as cidades do mundo onde há crack”, afirma o psiquiatra e professor da Unifesp Marcelo Ribeiro.
 De acordo com o estudo “Circuitos de uso de crack na região central da cidade de São Paulo”, da psicóloga Luciane Raupp e do cientista social Rubens Adorno, a procura pelo crack na região da Luz se intensificou em 1991 e alcançou grandes dimensões em 93. O estudo, apresentado na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (US), mostra que a prevalência do crack cresceu de 5,2%, em 89, para 65,1% entre 95 e 97. A droga passou a ser a mais consumida nesta região da cidade.
 Por ser barato e ter devastador poder de vício, o crack atingiu inicialmente as populações mais vulneráveis: crianças e moradores de rua. No entanto, o consumo logo se alastrou para outras classes sociais. Usuários costumavam ficar confinados por horas em construções abandonadas da região para consumir a droga perto dos traficantes. O uso à luz do dia também se tornou recorrente.
Os autores afirmam que a Cracolândia ganhou status de “nação independente”, ou seja, se “consolidou”, em meados dos anos 90, entre as gestões de Paulo Maluf (1993-96) e Celso Pitta (1997-2000).
 Em meados dos anos 2000 começou o “uso descarado” do crack na região. A definição da assistente social Neide de Almeida Nunes, que trabalha na Luz desde 1988, nada mais quer dizer que o uso público da droga passou a ser tolerado.
 Caso de polícia - As investidas para desmontar a Cracolândia, em diferentes governos, foram em vão até agora. A Operação Tolerância Zero, comandada pelo então governador Mário Covas (PDB), em 1997, foi a primeira grande ação policial a prender usuários. O resultado não foi nada auspicioso: a Cracolândia apenas se deslocou de algumas quadras para outras, na mesma região central.
 Na gestão Marta Suplicy não houve grandes operações policiais na região nem tampouco registro de ações sociais e de saúde. “A Cracolândia não apresentava a densidade de hoje e também não era uma das grandes preocupações da gestão”, admite o vereador e presidente municipal do PT, Antônio Donato, à época coordenador de subprefeituras.
 Segundo petistas, o objetivo era recuperar o Centro sem retirar quem morava ali, como os usuários. “Nós herdamos a gestão Maluf/Pitta, que era uma gestão de truculência. O lema que nós seguimos foi de recuperação da região central sem abandonar e retirar os moradores do centro”, afirma Aldaiza Sposati, secretária de assistência social da gestão.
 Aldaiza joga a culpa do crescimento da Cracolândia na gestão José Serra que, segundo ela, abandonou o projeto petista para o Centro e focou apenas na região da Santa Ifigênia, com o Projeto Nova Luz.
O pré-candidato e secretário estadual de Cultura, Andrea Matarazzo, rebateu a acusação em entrevista ao site de VEJA. “Os petistas não fizeram nada para acabar com a Cracolândia. Eles queriam melhorar o Centro sem tratar os dependentes e prender os traficantes. Falar que eliminamos projetos da região central é balela” afirma Matarazzo.
 Quando lançaram o Projeto Nova Luz, em 2005, os tucanos retomaram as ações policiais na região. “Há seis anos eu falo que a única maneira de combater o crack é com polícia para os traficantes e saúde para o usuário. Me chamavam de maluco, mas sempre tive certeza disso”, diz o pré-candidato tucano.
 Batalha - Vinte anos depois de a Cracolândia sofrer um processo de “consolidação” (embora, na prática, o consumo tenha se deslocado algumas vezes, dentro de um quadrilátero), o poder público ainda tenta erradicar a droga do Centro de São Paulo. Em 2007 e 2009, o prefeito Gilberto Kassab (PSD) chegou a anunciar o fim da Cracolândia. Agora, diz que tudo será diferente, pois a cidade está preparada para tratar o dependente químico.  O tempo dirá se, desta vez, haverá sucesso na empreitada.
 Especialistas são unânimes ao criticar a falta de continuidade na implantação de políticas públicas de prevenção e tratamento para usuários de crack. É verdade. Mas a discussão vai muito além da busca de culpados. E há um agravante: além de ser uma questão de saúde pública, o combate ao crack é, também, e acima de tudo, uma questão de segurança pública. Não haverá sucesso sem sufocar o tráfico de drogas.
 Nos Estados Unidos, além de desmantelar o esquema dos traficantes, as autoridades criaram tribunais especializados em delitos relacionados ao uso de drogas. O governo americano não conseguiu acabar com o consumo do crack, mas o uso despencou de 337 000 pessoas, em 2002, para 83 000 em 2011. Em São Paulo, a polícia - em uma ação "desastrada" ou não - conseguiu ao menos desmontar o cenário dos traficantes. O primeiro de muitos passos que a sociedade espera serem dados em busca de triunfo na batalha contra esse flagelo.

Revista Veja 21/01/2012.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012


Holanda restringe consumo e turismo da maconha entra no prejuízo.

Desde o dia primeiro deste janeiro, os donos de cafés autorizados a vender maconha na Holanda estão a falar em falência e na dispensa de empregados. Eles reclamam de restrições à comercialização, em especial com relação aos turistas e estrangeiros. Alguns economistas, em tempo de crise na zona do euro, sustentam que a proibição de venda de maconha aos turistas e estrangeiros nos cafés holandeses afetará o Produto Interno Bruto dos Países Baixos: pib-holandês.
No mundo, calcula-se que 203 milhões de pessoas fumem maconha. O Marrocos é o maior produtor mundial. Lógico, nem todos viajam para a Holanda a fim de fumar nos mais de mil estabelecimentos, tipo coffe-shop, autorizados.
Na Holanda, os cafés movimentavam anualmente 3,9 milhões de euros. Dessa “grana” toda, 70% provém dos turistas. Em toda o país e não só nos cafés, o mercado da maconha movimentava anualmente 10 bilhões de euros. Na fronteira, muitos belgas atravessam para freqüentar os cafés canábicos holandeses. E os moradores das pequenas cidades não gostam desse tipo de convívio, que apelidaram de “Turismo da Maconha”.
Vale lembrar que para cortar a interdependência entre o usuário e o traficante, a Holanda, desde 1968, admite a venda em cafés, mediante alvará. Alvará com expressa proibição de oferta a menores de 18 anos. E cada café só pode vender, para consumo no próprio local, até meio-quilo de maconha por dia, com princípio ativo variável.
Desde o início do ano, portanto, a venda de maconha em café ficou restrita. E a contar de março próximo, os estabelecimentos só poderão oferecer ao holandês a maconha light, ou seja, com teor ativo (tetra-hidro-cannabinol) de até 15%.
Outra restrição diz respeito à cassação de alvarás de estabelecimentos distantes a menos de 350 metros de estabelecimento escolar. Pelos cálculos, serão afetados cerca de 400 cafés.
Os proprietários de cafés foram à procura, na Corte Européia de Justiça (a Holanda integra a União Européia), de um ministro tipo Marco Aurélio Mello. Mas não se deram bem. Para a Corte de Justiça Européia não há discriminação ao se tratar turistas de forma diferente de holandeses. E é legítimo, para essa Corte, acabar com o turismo da maconha.
Pano rápido. O “turismo da maconha” será afetado. Alguns comerciantes apostam naqueles que se contentarão com a condição de fumantes passivos. E aí, quanto mais fumaça esverdeada, mais lucro.
Wálter Fanganiello Maierovitch, do Terra

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012


Os domínios da drogalândia
GAUDÊNCIO TORQUATO
À primeira vista, a repressão aos consumidores e vendedores de drogas na região central da cidade de São Paulo conhecida como cracolândia se resume à questão: adotar o método da tolerância zero, praticado pelos Estados Unidos e que consiste na retirada forçada das ruas de dependentes e traficantes, ou implantar o sistema europeu, usado por países como França, Espanha e Holanda, permissivo e que comporta até um padrão de consumo de drogas considerado não tão prejudicial? A par das evidências de que a ação policial pecou pela ausência de articulação entre as instâncias federal, estadual e municipal, escancara-se a hipótese de que a pirotecnia, que agradou aos moradores das regiões invadidas, se assemelha à prática de enxugar gelo. Os viciados tentarão conseguir a droga em outras regiões, ajudando criminosos do narcotráfico a conquistar novos territórios. Enquanto houver demanda, haverá oferta. E a experiência tem demonstrado que a abstinência forçada da droga não tem diminuído o contingente de viciados. Nos EUA, apenas 30% dos dependentes conseguem abandonar o vício.
O affaire paulistano indica a necessidade de o País substituir medidas improvisadas por consistentes programas de prevenção e reinserção social, o que se faz absolutamente premente ante este dado estarrecedor: o crack pode ser encontrado em 98,7% dos municípios brasileiros. A cada ano se expande a estética da degradação que acolhe os usuários em praticamente todas as regiões do Brasil. Ao contrário do que se supõe, o balão das drogas infla mesmo sob pressão de programas desenvolvidos por uma pletora de órgãos, fóruns, entidades e movimentos espalhados pelo território. O tráfico não dá sinais de que reflui.
Não se trata, porém, de uma característica brasileira. Redes governamentais, agências e organizações internacionais que atuam na vanguarda e na retaguarda das batalhas contra as drogas não têm conseguido sustar as redes de corrupção e os polos de irradiação do narcotráfico, controlados por financiadores, transportadores e agentes que comerciam um dos negócios mais rentáveis do planeta.
Infelizmente, o Brasil tornou-se espaço estratégico do esquema. Desde o início dos anos 1990, quando os EUA passaram a controlar a região do Caribe, o País foi escolhido pelos cartéis para ser, inicialmente, rota de trânsito, ao lado da Europa Oriental, da zona ao sul e ao leste do Mediterrâneo, do México e de países africanos. Depois ganhou a posição de entreposto para estocagem, produtor de drogas (incluindo centros de processamento de folhas de coca e laboratórios para refino de cocaína) e plataforma de exportação.
Essa é a explicação para o fato de, por estas plagas, a indústria da droga crescer em progressão geométrica, enquanto o aparato de combate caminha em progressão aritmética. O País já ocupa o segundo lugar no ranking mundial de lavagem de dinheiro apurado pelo narcotráfico na América do Sul. A questão, portanto, é muito mais grave que a leitura que se extrai da polêmica sobre as cracolândias do arquipélago nacional.
Os polos de consumo de drogas integram um gigantesco empreendimento internacional, cujas conexões envolvem sistemas bancários (nacionais e internacionais), empresas farmacêuticas, meios de transporte intermodais, estruturas de Estado, organizações políticas e partidárias, forças policiais, subindo ao sagrado altar do Judiciário. Pode parecer exagero. Estudiosa da matéria, Lia Osório Machado, em documento sobre O comércio ilícito de drogas e a geografia da integração financeira: uma simbiose?, mostra que parcela ponderável do PIB mundial deriva do comércio ilegal de drogas. O lucro do crime transnacional é da ordem de US$ 1 trilhão, do qual parcela considerável (podendo chegar a US$ 500 bilhões) é processada pelo sistema bancário mundial após a "limpeza" nas lavanderias de dinheiro. Aliás, o combate à lavagem de dinheiro é o centro da luta contra o narcotráfico, a partir dos EUA.
Não é de admirar que esse portentoso empreendimento, que cria um Estado informal dentro do Estado formal, seja capaz de alterar a fisionomia geográfica e populacional de países, contribuindo para a expansão de cidades médias, alterando o mapa da distribuição de habitantes via fluxos migratórios e influindo na condução dos poderes locais e regionais. Parte dos lucros é estocada em bancos subterrâneos, seja para financiar programas sociais, seja para alavancar obras de infraestrutura, e outros recursos são destinados ao financiamento de guerras e movimentos de terror. Os domínios da drogalândia são tão largos que se chega a apontar, em certos territórios, a participação de narcodivisas no incremento de reservas cambiais, contribuindo para ajustar políticas monetárias, bancárias e financeiras de governos periféricos.
Insira-se essa engrenagem na moldura das economias transnacionais, adicione-se a paisagem dos "paraísos fiscais" e, assim, se chega facilmente à conclusão de que um espaço continental como o Brasil, com 16,8 mil quilômetros de fronteiras (7 mil de fronteiras secas e 9,8 mil de fronteiras de rios), constitui alvo central para o império da droga. Sob esse formato, nosso mapa ultrapassa a geografia sul-americana, conectando-se a superfícies intercontinentais. Com essa preocupação, o governo brasileiro determinou prioridade para o Plano Estratégico de Fronteiras, que em seis meses apreendeu cerca de 115 toneladas de maconha e cocaína.
Ter controle sobre o território, eis a condição sine qua non para o Brasil armar sua política de combate às drogas. Outros verbos são fundamentais nesse processo: coordenar, integrar, flexibilizar, harmonizar, dinamizar. Das funções que deles se extraem dependerá a eficácia das ações. Claro, os programas devem fluir harmoniosos e bem articulados entre as instâncias federal, estadual e municipal. Só assim serão capazes de evitar o espetáculo pirotécnico que se viu na cracolândia paulistana.


Internação involuntária
 Darléa Zacharias
Muitas vezes nos perguntamos se estamos sendo duros demais  com  nossos  adictos  ao  tomarmos  a  decisão  de interná-los; mas  existe um momento  em que precisamos ser firmes e fazer por eles o que não conseguem fazer sozinhos.
Eu  estou  me  referindo  ao  dilema  que  muitas  vezes compartilhamos, ao  levá-los, contra a própria vontade, às internações  involuntárias. Ao agirmos de tal modo, poderemos  nos  sentir  o  pior  dos  seres  humanos,  covardes  e cruéis, mas não é bem assim. Sabemos que, embora não os compreendamos, os amamos, e amá-los com todas as nossas  forças  significa  resguardá-los. Mesmo que não  entendam  desta  forma,  mesmo  assim,  precisamos  fazê-lo  o quanto  antes. Precisamos urgentemente protegê-los deles mesmos.
Quando  fui  internada  contra minha  própria  vontade, no ano de 1998, só eu e Deus sabemos o que senti naquele momento. Eu me  senti o pior dos  seres humanos! Eu achava  que  era  uma  vítima  da  covardia  e  de  um  grande complô. Eu  achei que  a minha  família havia desistido de mim, e que me internar à força era uma boa forma de se livrarem do peso que me  tornei em  suas vidas. O  tempo passou, eu fiquei limpa, amadureci, perdoei e fui perdoada e pude ver, através dos olhos da recuperação, o quanto me amavam e como foi difícil para eles tomarem a decisão de me internar  involuntariamente.  Eu  percebi  que  agiram certo,  na  hora  certa  e,  com  firmeza,  no momento mais crítico  da minha  vida  eles me  resguardaram  das minhas insanidades e salvaram-me.
Olhar o ato da retirada de circulação de um adicto em plena queda para  a morte  e  julgar um  familiar que  toma esta  complicada  decisão  é  fácil, mas  somente  quem  tem nas  mãos  uma  batata  quente  como  esta  pode  entender como  é  torturante  se  perguntar  se  está  fazendo  a  coisa certa ou não.
Anos mais tarde, passei pelo mesmo drama novamente, só que desta vez em lados opostos da situação, e eu precisei optar pela mesma decisão que minha família  teve que tomar um dia, em  relação  a mim. Eu vi o meu sobrinho que tanto amo morrendo nas garras do crack, e coloquei em  prática  a  experiência  que  eu mesma  havia  vivido  no passado e o internei involuntariamente. Ele chorava, dizia que aquele lugar era horrível, que lá usavam drogas e que ele era muito mal tratado. Eu precisei ser forte, pois eu já conhecia muito bem aquele autopiedoso discurso. Muitas vezes  eu  narrei  a mesma  história  na  esperança  de  que  a minha família tivesse pena de mim e me levasse para casa.
Por várias vezes durante as visitas voltei para casa chorando, me perguntando se era verdade o que ele me dizia, mas qualquer coisa que ele vivenciasse ali internado, seria melhor do que a morte que teimava em levá-lo a céu aberto.
Eu me mantive firme em meus propósitos e ele ficou internado por alguns meses. Quando saiu de lá, eu o levei imediatamente a uma  reunião  de  12  passos,  e  hoje,  ele  se encontra limpo há 6 meses. Ele está trabalhando, se reformulando  e  crescendo.  Estancou o  processo  obsessivo-compulsivo.  Imaginem  se eu não  tivesse  feito o que precisava ser feito, no momento certo? Hoje, estaríamos com certeza, chorando a sua morte.
Sei  que  ele  não  tinha  sanidade  nem  forças  para  levar adiante o afastamento das drogas por si só, por isso, entrei em  ação.  Mesmo  que  meus  planos  e  minha  decisão  de interná-lo  não  funcionassem,  eu  precisava  fazer  a minha parte, pois a pior coisa que poderia acontecer, seria perdê-lo e  levar comigo, pela vida  inteira, a culpa por não  tê-lo internado, mesmo contra própria vontade. Precisei fazer o que era certo, mesmo que o machucasse demais, e tal ato fosse de encontro a tudo que eu pensava e acreditava. Eu precisava  rever os meus  conceitos de  amor porque muito pior do que deixá-lo na reabilitação, muito pior seria chorar a sua morte, sem ao menos tentar de uma forma, drástica mas eficientemente capaz de ajudá-lo. Eu precisava manter a minha mente aberta e ter a certeza que fiz a minha parte até o fim e funcionou.
Sei  que  ele  não  pararia  de  usar  se  não  quisesse, mas tenho a consciência tranqüila de que fiz o que precisava ser feito.
Hoje,  agradeço  imensamente  minha  mãe  e  meu  ex-marido por terem feito por mim o que eu não pude fazer.
"Amar é abdicar de si mesmo e das próprias verdades.
É fazer o que tiver que ser feito, é ter coragem para modificar aquelas coisas que podemos com sabedoria.
É colocar a  razão  em  primeiro  lugar,  e  não  agir  guiado  pela emoção. Os caminhos  do  coração  são  tortuosos  e  o  da razão é, com certeza, sempre o mais sensato."
Só por hoje!
Trecho do livro "Drogas: a apnéia da vida" ainda em fase de edição.