quarta-feira, 25 de janeiro de 2012


A grande festa.

O Carnaval, uma das festas mais populares do país, infelizmente evidencia um modelo bastante difundido e incentivado socialmente por aqui: o beber excessivamente
Artigo de Joaquim Melo para a Folha de S. Paulo
E, só para não perder o costume, as festas das principais cidades brasileiras estão sendo patrocinadas por grandes cervejarias. Empresas que, fornecendo uma série de aparatos para a realização dos eventos, têm como principal objetivo incentivar o consumo de álcool.
Para quem ainda duvida que o patrocínio de eventos culturais por fabricantes de bebida estimule o consumo, um bom exemplo é o último Rock in Rio.
A cervejaria apoiadora divulgou ter atingido o maior número de vendas da companhia mundialmente neste tipo de ação, comercializando 1, 7 milhões de copos de chopp. A marca reformou ainda o enorme sucesso com o público jovem público que, vale lembrar, por fatores físicos e psicológicos, é mais vulnerável a desenvolver dependência do álcool.
Como patrocinadoras, as fabricantes divulgam amplamente sua marca e estimulam livremente o consumo. Por isso, é no mínimo preocupante a posição do governo que, cedendo às pressões comerciais da Fifa, liberou a venda de bebidas alcoólicas nos estádios durante a Copa de 2014. Independentemente das regras estipuladas para o consumo, o pais aceitou transpor uma lei muito bem constituída e amplamente apoiada pela população em prol de uma marca de cerveja.
A decisão contraria o que se espera do poder público em seu compromisso de zelar pelo bem-estar e pela saúde dos brasileiros. Contaria também a expectativa de leis mais rígidas em relação à publicidade de bebidas alcoólicas.
Assim como já ocorre com o cigarro, proibir a propaganda de cerveja nos meios de comunicação é fundamental para moderar o consumo. As restrições à publicidade de cigarros e derivados do tabaco, por exemplo, reduziu a prevalência de fumantes na população de 32 % em 1989 para 19 % em 2006.

É uma medida essencial ainda para proteger os jovens. A publicidade é dos principais estímulos para o consumo do álcool entre crianças e adolescentes. Não por acaso, os comerciais de cerveja trazem mulheres bonitas, jovens de plásticas perfeitas, atletas e artistas consagrados. Tudo para reforçar os ideias de beleza e sucesso para quem consumir a marca da vez.
O patrocínio e a publicidade institucional também não ficam atrás. Eles respaldam a equivocada concepção do álcool como algo indissociável da organização social e cultural do país, com evidentes prejuízos para a população e para o sistema público de saúde.
No Carnaval, uma festa que já é associada à “bebedeira”, a situação é ainda pior quando fica evidente o apoio do poder público local a esse tipo de patrocínio.
As empresas oferecem recursos estruturais para o evento, e o Estado parece não ver uma oportunidade de se eximir da responsabilidade de proporcionar a infraestrutura adequada para comemoração.
É uma associação que, certamente, vai causar muitos prejuízos. Basta lembrar dos malefícios do álcool à saúde e dos mais variados tipos de violência relacionado ao eu consumo. Só no ano passado, durante o feriado de Carnaval ocorreram 2.411 mil feridos e 213 mortos nas estradas federais.
Considerando o enorme custo social do álcool para o país, é imprescindível uma legislação mais rígida com relação a publicidade de bebidas alcoólicas, restringindo inclusive o patrocínio de eventos culturais. A realidade é bem diferente de toda a alegria vista durante as comemorações. Definitivamente, cerveja não é confete de carnaval.
Joaquim Melo, 58, médico do trabalho e gastroenterologista, é presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead)

Nenhum comentário:

Postar um comentário