COMO
O ÁLCOOL AGE SOBRE O CÉREBRO?
CIÊNCIA
EXPLICA BEBEDEIRA.
Flávio Iha Colaboração para
o UOL, em Porto Alegre
Durante a folia, quem não
quer tomar uma bela cerveja gelada ou um sacolé alcoólico? Mas, é bom saber que
o álcool, além de dar aquela sensação de relaxamento, também afeta diretamente
vários órgãos importantes do nosso corpo, em especial o cérebro. Se for
consumido em doses excessivas, então, os danos podem ser irreversíveis.
Bebidas alcoólicas, por
mais leves que sejam (com teor inferior a 3% sobre cada litro), entram na
corrente sanguínea rapidamente depois de serem absorvidas pelo estômago e pelo
duodeno e de serem despejadas no fígado, que atacará a substância estranha para
eliminá-la do organismo. Da corrente sanguínea, chegar ao cérebro é questão de
minutos. Poucos minutos
“O álcool é uma droga que
age do fio de cabelo até o dedão do pé. Mas a ação farmacológica inicial mais
identificável é o efeito cerebral, caracterizado por certo torpor e sensação de
relaxamento. Em doses pequenas, o efeito pode ser agradável. Mas se as doses
forem aumentadas de forma aguda, o torpor é mais intenso e pode até levar ao
coma – o que é raro, mas não improvável”, alerta o médico Ronaldo Laranjeira,
da Unifesp.
Primeiro nos
neurotransmissores.
Logo que chega ao cérebro,
poucos minutos depois de ser ingerido, em qualquer quantidade, o álcool começa
a agir sobre os neurotransmissores – substâncias responsáveis pelas trocas de
mensagens entre as células cerebrais. Especialmente sobre dois, bastante
importantes para o comportamento humano: o ácido gama-aminobutírico, cuja sigla
é Gaba, e a serotonina.
Nossos neurotransmissores estão
divididos em dois grupos: excitatórios, quando estimulam a atividade elétrica
do cérebro, ou inibitórios, quando a reduzem.
O etanol aumenta os efeitos
do Gaba, um neurotransmissor inibitório, o que causa os movimentos lentos e a
fala enrolada que frequentemente se observam em pessoas alcoolizadas.
Ao mesmo tempo, inibe o
neurotransmissor excitatório glutamato, suprimindo seus efeitos estimulantes e
levando a um tipo de retardamento fisiológico. O sistema Gaba atua sobre o
controle da ansiedade. Ou seja, quando “armado” pela inibição da produção de
glutamato, deixa as pessoas mais relaxadas e com capacidade de interagir melhor
com grupos. Quanto mais Gaba, menos autocontrole.
"Se uma pessoa chega a
uma festa muito ansiosa, com medo de ser criticada ou de estabelecer relações,
uma pequena dose de álcool irá relaxá-la um pouco e a tornará menos perceptiva
em relação aos outros. Isso é efeito do sistema Gaba.” Ronaldo Laranjeira, da
Unifesp
Aumento de serotonina.
Quase ao mesmo tempo o
álcool também aumenta a liberação de serotonina, neurotransmissor que serve
para regular o prazer e o humor. Com mais serotonina, que é considerado o
hormônio a felicidade, mais euforia – e, em alguns casos, atitudes que podem
resultar em atos violentos.
“As maiores alterações
eletrofisiológicas do álcool foram registradas na região do tálamo, que é um
dos principais centros da organização cerebral. Ela é a porta de entrada no que
se refere à sensibilidade”, explica o neurocirurgião Flávio Settani, também da
Unifesp.
Isso porque o álcool é uma
substância complexa, com ação farmacológica muito variada e que atua
diretamente como depressor sobre o Sistema Nervoso Central (SNC). A partir do
momento em que o consumo aumenta, ele pode agir não só no sistema de
relaxamento, controlada pelo Gaba, mas em outros sistemas do cérebro.
Sonolência ou agressividade;
Dependendo da quantidade
ingerida e da química cerebral de cada pessoa, o relaxamento inicial pode dar
lugar à sonolência ou, em certos casos, a muita agressividade.
Coordenador da Unidade de
Dependência Química do Hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre, o psiquiatra
Sérgio de Paula Ramos alerta que as “alterações morais” do álcool,
especialmente em situações de abuso, podem ser bastante nocivas se não forem
controladas adequadamente.
“As alterações de
comportamento podem incluir exposição moral, comportamento sexual de risco,
agressividade, labilidade do humor, diminuição do julgamento crítico,
alterações no afeto, na fala, na diminuição do desempenho motor, no pensamento
e também baixa coordenação motora. Esses efeitos podem afetar qualquer
indivíduo, em todas as idades”, adverte.
Uso contínuo pode levar a
cirrose, diabetes e depressão.
As consequências do uso
continuado de álcool, para Ramos, podem ser devastadoras: desenvolvimento de
doenças autoimunes, cirrose, diabetes e depressão, para citar apenas alguns
exemplos. “E com um agravante: bebidas alcoólicas são drogas legais, estão à
venda em cada esquina. De todas as drogas, o álcool é a que tem o maior número
de usuários e a que começa a ser consumida mais cedo, entre os 12 e os 13 anos
de idade”, argumenta.
O poder destrutivo do
álcool, segundo o psiquiatra, vem da capacidade de provocar lesões em tecidos
adiposos, cobertos de gordura. Como o cérebro é todo revestido de tecido
adiposo, ao atacar essas regiões o álcool desencadeia um processo inflamatório
no cérebro, que altera a bioquímica e, consequentemente, as transmissões
elétricas entre as sinapses (feitas pelos neurotransmissores).
“No primeiro momento, o
álcool relaxa. No segundo, provoca euforia. No terceiro, vem a depressão. E, se
a pessoa não parar de beber, o álcool leva ao coma”, adverte.
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