As casas dos
chefes do tráfico
Damien Cave
CIDADE DO MÉXICO - As casas dos mexicanos de alto
poder aquisitivo geralmente são cercadas por portões ou muros que resguardam a
privacidade dos moradores e os protegem contra assaltos. E não há casas mais
protegidas que as dos chefões do narcotráfico no país. Na imaginação pública, a
"narquitetura" é marcada pelo excesso -em parte "The Real
Housewives", em parte "Scarface".
Na
vida real, porém, apenas parte disso se aplica. Sendo correspondente do
"New York Times" no México, fiquei curioso em relação às pessoas que
comandam as redes criminosas deste país. Onde vivem e como é sua vida
doméstica?
Com
a ajuda da agência federal de leilões do México, consegui entrar em várias
residências confiscadas. O que encontrei foi um misto de estereótipos e
elementos dissonantes. Havia sinais de jovens que ganhavam e gastavam muito
dinheiro rapidamente, mas também havia indícios de vida familiar, perigo e
tédio.
Em
várias cidades mexicanas há mansões com cúpulas que lhes conferem um toque
árabe. Alguns acadêmicos que estudam a cultura da criminalidade mexicana dizem
que as cúpulas viraram um símbolo visual da atração duradoura exercida pelo
tráfico: ele oferece um caminho para a ascensão econômica.
"No
mundo do tráfico eles encontram tudo que não conseguem encontrar em outro
lugar", disse José Manuel Valenzuela, professor de sociologia no Colégio
da Fronteira Norte, em Tijuana. "Não é uma questão apenas de dinheiro.
Trata-se, também, de conseguir poder."
Nos
anos 1970 e 1980, até mesmo no início da década de 1990, construir como um rei
causava impressão forte. Com o tempo, porém, os chefes do tráfico passaram a
adotar um perfil mais discreto.
Na
residência mais extravagante que vi na Cidade do México, antes ocupada por um
importador de farmacêuticos acusado de conspirar com o cartel de Sinaloa, mesas
barrocas se misturavam com sofás minimalistas de couro, tapetes orientais e uma
cópia do quadro "Guernica", de Picasso.
Os
traficantes jovens tendem a ter gostos mais cosmopolitas que seus antecessores.
"Eles são orgulhosos e vaidosos", comentou o antropólogo Howard
Campbell, da Universidade do Texas, em El Paso.
Em
um imóvel bizarro na Cidade do México, cor-de-rosa, de três andares e com
piscina cercada por paredes de vidro, havia escovas de dentes infantis em um
dos banheiros.
Presume-se
que todas pertenciam ao filho do empresário sino-mexicano Zhenli Ye Gon, preso
em 2007 acusado de importar substâncias proibidas usadas na produção de
metanfetamina.
Ele
se declara inocente, apesar de as autoridades terem encontrado armas e mais de
US$ 200 milhões escondidos na casa.
O
professor Valenzuela disse que os filhos constituem uma parte importante da
vida dos chefes do tráfico, porque os pais querem ver seu legado ser levado
adiante por outras gerações de suas famílias.
"Eles
não são monstros nem aliens de outro planeta", disse Valenzuela.
"Muitos dos valores sociais deles são iguais aos de todo o mundo."
Pode ser. Mas o mundo do tráfico mexicano vem se tornando muito
mais sanguinário. Mais de 47 mil pessoas foram mortas nos últimos cinco anos,
no país.
Nenhum comentário:
Postar um comentário