sábado, 18 de fevereiro de 2017



MINISTRO PROPÕE MUDANÇAS EM PROJETOS DO GOVERNO SOBRE DROGAS.


O GLOBO

Osmar Terra prega foco em abstinência e defende isolamento de pequeno traficante
POR RENATA MARIZ

Osmar Terra diz que liberação da maconha pode aumentar índices de violência - André Coelho

BRASÍLIA — Após se autonomear representante do Ministério do Desenvolvimento Social no Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (Conad), o titular da pasta, Osmar Terra, começou a revisar o material de capacitação do governo federal na área de atenção a dependentes químicos. Ele vai propor alterações no conteúdo dos cursos, que são voltados a profissionais de saúde, justiça, assistência social, líderes comunitários e outros agentes envolvidos no tema das drogas.

Na avaliação de Terra, as capacitações, que são patrocinadas pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), à qual o Conad está ligado dentro do Ministério da Justiça, não incentivam o tratamento e a abstinência, e só se concentram na política de redução de danos, que tem como objetivo diminuir os problemas de saúde decorrentes do uso de drogas entre usuários que não querem ou não conseguem abandonar o vício.

— Todos os textos, o material de capacitação para discutir a questão das drogas, tratam apenas de redução de danos. Eles não pregam que a pessoa tem que se tratar, tem que ficar em abstinência. É um dinheiro jogado fora — critica o ministro.

Ele ataca também os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), onde é ofertado tratamento para dependência química no Sistema Único de Saúde (SUS), por trabalharem na lógica da redução de danos:

— Os Caps não têm resultado prático. As mães ficam desesperadas. Levam os filhos e, no dia seguinte, eles estão usando droga de novo, porque nos Caps dizem: “não tem problema, só não fuma na latinha, usa cachimbo de vidro, usa seringa descartável”.

Médico com mestrado em Neurociência e forte atuação parlamentar contra a descriminalização das drogas, Terra defenderá que, além da redução de danos, os cursos ampliem o foco em iniciativas que levem ao abandono do uso. Ele já fez as propostas de alteração no material e tem cobrado a realização de uma reunião do Conad para apresentar as sugestões.

Desde que se nomeou para uma das cadeiras, em agosto, houve apenas um encontro, segundo Terra. Na ocasião, o clima ficou tenso, principalmente entre o ministro e representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da União Nacional dos Estudantes (UNE), de acordo com relatos.

Terra criticou o ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, que defendeu a legalização do uso da maconha e, caso a experiência desse certo, também da cocaína. Ele disse que Barroso “parte de premissas equivocadas sem qualquer evidência empírica ou histórica”. E, citando experiências internacionais, diz que nenhum país liberou drogas:

— Ao contrário do que dizem, o Uruguai não liberou as drogas. Liberou a venda de maconha em farmácia e a produção em quintal. Nos últimos dois anos, aumentou o tráfico das outras drogas com 2.700 presos, num país de 3 milhões de habitantes. Portugal descriminalizou o uso, o que na prática ajuda a liberar a droga, mas traz uma contradição: 
tu pode comprar, mas o outro não pode vender. Lá também todos os índices de violência pioraram. Nos Estados Unidos, os estados que liberaram nunca tiveram tanta mendicância e tanto homicídio. Tenho tabelas com os números.

Além do aumento da criminalidade, Terra aponta o adoecimento e a desagregação social como consequências certas da liberação das drogas. O ministro refuta ainda a ideia de que o tráfico e a violência a ele associada acabarão após a liberação, o que chama de “mais uma distorção” do debate sobre drogas:

— Primeiro que não vai deixar de existir o tráfico, isso não ocorre como uma fórmula mágica, e não é o tráfico que mais mata. A diferença é que a morte do tráfico é documentada, fica registrada. A morte do transtorno mental, da violência doméstica, dos latrocínios cometidos por quem está em busca de droga não aparecem, mas matam muito mais.

Ao contrário de uma corrente cada vez mais numerosa que prega o fim da restrição de liberdade de pequenos traficantes para não fornecer mão de obra às facções criminosas dentro de presídios, e também por considerar a medida desmesurada, o ministro defende que eles sejam retirados de circulação:

— Acho que esse dito pequeno traficante é o único traficante, não tem outro. O outro é o atacadista. Quem faz a droga circular é esse. Ele tem que sair da rua, não digo que ele tenha que ficar no presídio com o Fernandinho Beira-mar. Lá no Rio Grande do Sul, tem uma proposta de ter presídio, que pode ser chamado de instituto penal ou qualquer outro nome, em que eles fiquem em tratamento, separados dos criminosos que cometeram crimes mais graves.

Terra considera a lei atual, criticada por muitos como responsável por encarcerar desnecessariamente usuários e pequenos traficantes, “frouxa”, e afirma que o aumento do número de presos por envolvimento com drogas é apenas um reflexo do aumento da atividade nas ruas do país:

- O número de presos por droga não é por causa da lei. A lei é ruim, frouxa, não prende ninguém. O aumento de pessoas detidas por causa de drogas é pelo surto epidêmico de drogas que estamos vivendo. Nunca teve tanto traficante vendendo droga. A oferta é gigantesca.


O ministro ironiza a crítica contra a chamada “guerra às drogas”, afirmando que todos os países se opõem aos entorpecentes com regras limitadoras porque os danos são expressivos:— As drogas sempre existiram, é verdade, mas de forma artesanal. Quando começa a produção industrial, os países passam a proibir, porque era uma desagregação social numa escala tão grande que teve de ser proibida. Não tem nada de moderno em liberar drogas.

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