BARRY
SAMPLE, TOXICOLOGISTA: 'A COCAÍNA É A DROGA NÚMERO UM NAS ESTRADAS'.
Agência o Globo
Americano veio ao Rio para
negociar instalação de laboratório exclusivo para exame de amostras de cabelo
no Brasil
POR HUGO LIMARQUE
'A dependência causa a
impressão de que a quantidade empregada não tem o mesmo efeito de antes',
explica o toxicologista Barry Sample - Leo Martins / Agência O Globo
"Sou natural de
Indianápolis (EUA), tenho 61 anos, dois filhos e trabalho com exames
admissionais para empresas. Minha atividade no ramo do teste de drogas se
estendeu para o Brasil, de onde analiso amostras de cabelo para determinar se
motoristas profissionais estão habilitados a dirigir."
Conte algo que não sei.
Ao contrário dos EUA, cujo
departamento de transportes ainda tem a urina como principal tipo de amostra em
testes de drogas, o programa adotado pelo Brasil priorizou o cabelo nas
avaliações, o que representa, na minha opinião, uma tomada de liderança global.
Até porque os americanos se encarregam da maioria dos exames de outros países.
O fio capilar é mais completo, na medida em que pode detectar o uso de drogas
por, no mínimo, 90 dias.
E
como o cabelo consegue guardar informações por tanto tempo?
Quando alguém consome uma
droga, ela geralmente leva entre um e três dias para ser eliminada do
organismo. No caso do fio de cabelo, a substância é incorporada ao bulbo
capilar através da corrente sanguínea e não tem como sair de lá. Nesse caso, o
exame pode detectar um consumo de drogas a longo prazo e traçar um histórico de
uso. O mesmo raciocínio vale para o pelo.
O
exame de cabelo poderia ter outras utilidades?
Certamente. O teste de
drogas em geral pode ir além da aplicação no transporte. Alguns empregadores
nos EUA utilizam exames toxicológicos para promover um ambiente de trabalho
livre de drogas, onde os funcionários estejam seguros e não percam
produtividade. Há estudos por lá que mostram que empresas abertas à política de
testes sofrem menos com acidentes de trabalho.
Por
que o Brasil vai passar a ter um laboratório próprio para examinar cabelo?
Desde março de 2016, todos
os motoristas de caminhões, ônibus e vans do Brasil são obrigados a fazer o
teste do cabelo se quiserem tirar ou renovar a carteira de habilitação. Com
isso, milhares de amostras hoje são levadas para os EUA. É uma logística
complexa, que prolonga o ciclo do teste e tem um custo adicional. Um
laboratório no Brasil diminuiria os gastos e possibilitaria um serviço mais
ágil.
Falando
em caminhões, é senso comum no Brasil que os motoristas desses veículos
costumam usar drogas para se manterem vigilantes ao volante durante a noite. O
resultado dos testes corrobora com essa afirmação?
Eu não tenho como dizer que
isso é verdade, mas, entre as categorias de motoristas que participam do teste,
os resultados mostraram que o principal positivo para drogas no Brasil, em
cerca de 70% das amostras, se deve à cocaína. Esse número sugere que talvez o consumo
não esteja ligado necessariamente à recreação, mas também ao uso ocupacional.
Os caminhoneiros preferiam anfetaminas, mas trocaram de substância porque a
cocaína é mais barata e acessível. No entanto, ambas levam o usuário a se
drogar mais, porque a dependência causa a impressão de que a quantidade
empregada não tem o mesmo efeito de antes.
Você
participou do controle antidoping nas Olimpíadas de Atlanta, em 1996. Como foi
a experiência?
Lembro que surgiu uma nova
droga na época, o psicoestimulante bromantan. Também fui responsável pelos
procedimentos laboratoriais durante os Jogos Panamericanos de Indianápolis de
1987 e encontrei atletas usando outra novidade, a probenecida. Parece que a
cada Olimpíada alguma coisa diferente aparece.
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