COMO
AS DROGAS NOS ENGOLEM.
A sociedade brasileira está
sofrendo os efeitos cada vez mais devastadores do uso de drogas produzidas e
distribuídas pelo pior tipo de gente – os traficantes. Aquilo que até algumas
décadas atrás parecia ser uma doença apenas das grandes cidades se espalhou por
todo o País, até por pequenos lugarejos.
Sim, mesmo na zona rural já
se observa o desespero de trabalhadores pela chegada do sábado, dia em que
recebem o pagamento semanal e correm atrás das drogas. Quem atua na área do
Direito percebe claramente que a droga está na raiz de mais da metade dos crimes.
De fato, os roubos, assaltos, latrocínios são em geral praticados por pessoas
que agem sob o efeito de drogas ou cuidam de seu transporte e distribuição.
O tormento nas
penitenciárias brasileiras, que causa perplexidade interna e externamente, é
claro reflexo da luta pelo controle do milionário mercado de venda de drogas.
O adolescente que na garupa
da uma moto atira aleatoriamente após extorquir a vítima assim age não por
pretender comprar uma roupa nova ou sair com a namorada. Ele precisa do
dinheiro para adquirir droga ou para pagar ao fornecedor – se não quitar a
dívida, pagará com a própria vida.
Em escala maior, nos
grandes centros o craque corrói a vontade e a saúde de milhares de pessoas,
escravizadas pelo vício e incapazes de dirigir a própria vida. Esse fenômeno
social é crescente e ultrapassa a anêmica vontade dos administradores públicos
responsáveis pelo combate aos traficantes.
Triste ver nesse terreno de
areia movediça que as pessoas se afundam e não conseguem voltar à superfície,
movidas pelo engano de preferir – muito mais – a droga à própria vida. De outro
ângulo, assusta a frieza do governo federal, que até o momento não fez emergir
um plano eficaz que tenha a ventura de proteger a sociedade e livrar do
sofrimento as famílias atingidas pelo desastre das drogas.
Décadas atrás o Brasil foi
capaz de idealizar um programa de combate à aids, revestido de êxito, mas até
agora, apesar do agravamento, nada que mereça respeito foi feito para enfrentar
a produção, o tráfico e a distribuição de drogas às pessoas.
Quando concorreu à
Presidência da República, o ministro José Serra disse que estava assustado por
não termos um plano verdadeiro de combate às drogas. Agora ele está na
posição-chave, como ministro das Relações Exteriores, porque a produção de
cocaína, craque e maconha é feita em países amigos – Venezuela, Colômbia e
Paraguai. Um bom trabalho diplomático com os vizinhos poderia ter melhor efeito
do que deixar nossas polícias enxugando gelo.
Se a droga for produzida, o
traficante sempre encontrará uma forma de fazê-la chegar ao consumidor, por mil
artifícios. O Brasil tem aproximadamente 8 mil quilômetros de fronteiras secas,
impossíveis de fiscalização permanente, por sua enorme extensão. Além disso,
nosso litoral é também imenso e a qualquer hora da noite um barco pode
aproximar-se da praia e descarregar uma tonelada de cocaína sem que ninguém
veja.
Para enfrentar essa
estratégia do mal, aperfeiçoada por décadas de combate ineficiente, o Brasil
precisa de um plano nacional. No momento esse trabalho está concentrado apenas
na fiscalização de umas minguadas fronteiras.
O presidente da Bolívia, a
quem Lula chamava de “o companheiro Morales”, é produtor de coca (a planta) e
chegou a dizer publica e hipocritamente que a cocaína não é um problema em seu
país. Não é mesmo, os bolivianos tomam um chá feito com folha de coca, não
ofensivo à saúde, assim como no Sul tomamos chimarrão. Se tivesse um mínimo de
dignidade pessoal, Evo Morales atuaria para impedir a produção de cocaína, que
é quase toda enviada para o Brasil.
Paraguai, Venezuela e
Colômbia são, como dito acima, países também amigos e neles a produção da droga
constitui antigo e lucrativo negócio de quadrilhas organizadas – tão
organizadas que nem mesmo a ação conjugada com o governo norte-americano
conseguiu impedi-las. Para os nossos vizinhos a imagem do Brasil não está
contaminada por preconceitos “imperialistas” e por isso uma ação diplomática
não seria mal recebida.
A importância econômica do
Brasil e o destaque alcançado no continente permitiriam que o governo
brasileiro se empenhasse num trabalho diplomático voltado para a redução da
produção de drogas. Desnecessário repetir que o prazer fugaz e enganoso
proporcionado pela droga destrói vidas, destroça famílias e necrosa gradativa e
crescentemente o tecido social. É incrível que isso continue a acontecer tendo
como expectadores nossos representantes no Congresso Nacional e no governo
federal.
O pior nesse quadro sombrio
e desanimador é que surgem a toda hora, lamentavelmente, como estímulos à
disseminação das drogas, vozes bastante lúgubres anunciando, por exemplo, que a
maconha não é danosa para o organismo humano e tampouco vicia. São afirmações
sempre alcançadas por boa dose de suspeição.
A maconha talvez seja a
mais danosa de todas as drogas, porque representa o início do plano inclinado
na vida dos que a experimentam. Esforços isolados são feitos junto à iniciativa
privada, a universidades e associações de classe, todas voltadas para a
tentativa de recuperação dos viciados.
Tudo isso é necessário e
merece estímulo, mas sem nenhuma dúvida falta uma ação programada de governo,
um plano, enfim, que alimente a luta contra a produção de drogas. Sem a
presença das drogas a criminalidade crescente, que destrói vidas e destroça as
famílias, poderá gradativamente arrefecer, criando um clima de esperança para
cada um de nós.
É nosso dever, em defesa
dos e nossos filhos, netos e da família, não ficar de braços cruzados e
aprender a cobrar, sempre, esforços verdadeiros e permanentes dos governantes.
Não é possível que faltem inteligência e coragem.
Aloisio de Toledo Cesar
DESEMBARGADOR APOSENTADO DO
TJSP, FOI SECRETÁRIO DE JUSTIÇA DO GOVERNO DO ESTADO.
O Estado de S.Paulo
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