O indivíduo visto como um todo.
Revista Psique Ciência e Vida - Neide Zanelatto
A droga é um fenômeno que
apresenta inúmeras dimensões e complexidades e pode estar presente em qualquer
família de qualquer classe social.
Quanto
mais cedo iniciado o seu consumo, piores as consequências - um fator que
contribui para o agravamento do problema é que alguns pais, por acreditarem que
a maconha (geralmente a porta de entrada para substâncias mais pesadas) é leve,
não procuram ajuda especializada em um primeiro momento. Tal postura pode
desencadear situações mais sérias. No entanto, hoje em dia, há um leque amplo
de possibilidades de tratamentos para os dependentes químicos.
Um
deles é o que se baseia em Terapias Cognitivo-Comportamentais. Uma das
profissionais que defendem essa abordagem é Neide Zanelatto, psicóloga clínica
formada pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), especialista em
dependência química, coordenadora e docente do curso de Terapia
Cognitivo-Comportamental aplicada ao tratamento da dependência química da
Unidade de Pesquisas em Álcool de Drogas-Universidade Federal de São Paulo
(UNIAD - UNIFESP).
Ela
explica os motivos: "Há três décadas, estudos evidenciam aeficácia das
terapias cognitivocomportamentais no tratamento de transtornos psiquiátricos,
entre eles o causado por uso de substâncias. Profissionais especializados e
conscientes usam sempre, em seus consultórios, modelos de intervenções baseados
em evidências científicas, e se forem bem treinados, e guardadas as diferenças
entre os casos, podem confirmar as evidências apresentadas nos estudos".
Apesar
de ser partidária da utilização das TCCs, Neide não minimiza a importância de
outras formas de terapias. "As TCCs são eficazes tanto como monoterapia
quanto como parte de um conjunto de abordagens, que tenha uma mesma meta em
relação ao tratamento. Sabemos que na dependência química, um fenômeno complexo
e de difícil manejo, quanto maior o número de abordagens associadas, melhor o
suporte para o paciente e melhores serão os desfechos."
A
psicóloga revela que é comum associar a terapia de incremento para a motivação
com terapia cognitivo-comportamental, por exemplo, pois na dependência química,
segundo ela, a motivação para a mudança tende a oscilar muito.
Ao
lado de Ronaldo Laranjeira, Neide lançou, recentemente, o livro O
tratamento da dependência química e as terapias cognitivo-comportamentais, que
aborda, justamente, a evolução do tratamento deste grave problema social e
aponta as TCCs como uma excelente alternativa para lidar com os pacientes.
A internação é feita em casos
nos quais as outras intervenções não funcionam ou quando o paciente coloca em
risco sua vida ou a de outrem, tem alguma comorbidade ou não alcança a
abstinência
ESTATISTICAMENTE,
O NÚMERO DE VICIADOS EM DROGAS (ILÍCITAS OU NÃO), NO BRASIL, VEM AUMENTANDO,
CHEGANDO, HOJE, A 13 MILHÕES DE DEPENDENTES QUÍMICOS. EM CONTRAPARTIDA, OS
CASOS DE INTERNAÇÃO CAÍRAM, EM DEZ ANOS, DE 51,3 MIL EM 2002 PARA 32,6 MIL EM
2012. ISSO NÃO LHE PARECE PARADOXAL? A QUE SE DEVE ESSA APARENTE DISCREPÂNCIA?
NEIDE
APARECIDA ZANELATTO ALVES DA SILVA - Essa visão paradoxal pode ser bem
explicada pelo fato de que, há uma década, a internação era tida como o
tratamento "ouro" para a dependência química. Hoje, os estudos atuais
vêm mostrando que temos um leque de alternativas e modelos de terapia:
tratamento psicoterápico, tratamento farmacológico, em ambiente ambulatorial,
combinação destes dois, também em ambiente ambulatorial, moradias assistidas,
tratamentos de internação domiciliar com acompanhante terapêutico etc.
Parece-me que não diminuíram as intervenções terapêuticas, mas as opções
aumentaram.
A
internação é feita em casos em que as outras intervenções não funcionam, ou
quando o paciente coloca em risco (pelo uso de drogas) a sua vida ou a de
outrem, quando tem alguma comorbidade (que não pode ser bem diagnosticada
durante a vigência do uso de substâncias psicoativas) ou não consegue, de
nenhuma forma, alcançar a abstinência (meta do tratamento).
O
AUMENTO NO NÚMERO DE CONSUMIDORES DE DROGAS É UMA DEMONSTRAÇÃO CLARA DA POUCA
EFICÁCIA DOS MODELOS TRADICIONAIS DE TRATAMENTO PSICOLÓGICO?
NEIDE - O aumento do número de experimentadores pode se dar pelo tipo de crença que se tem a respeito do uso de substâncias. No meu modo de ver, essa crença pode ser influenciada pelas propagandas, cultura, opiniões dos pares, visão de mundo da família e comportamentos adotados, modelos (como artistas, personagens de novela, por exemplo) e pelo contexto no qual está inserido o indivíduo que experimenta. Da experimentação para o consumo, propriamente dito, outras variáveis, como características de personalidade, história de vida, avaliação das sensações eliciadas pelo uso como positivas, entre outras, quando combinadas, abrem espaço para que manutenção do uso se estabeleça. E assim por diante, se as experiências com a substância forem consideradas positivas, associadas aos processos de neuroadaptação, pode-se considerar a chance da ocorrência da dependência. A meu ver, não existe relação entre o aumento do número de experimentadores e a pouca eficácia dos modelos de tratamento.
NEIDE - O aumento do número de experimentadores pode se dar pelo tipo de crença que se tem a respeito do uso de substâncias. No meu modo de ver, essa crença pode ser influenciada pelas propagandas, cultura, opiniões dos pares, visão de mundo da família e comportamentos adotados, modelos (como artistas, personagens de novela, por exemplo) e pelo contexto no qual está inserido o indivíduo que experimenta. Da experimentação para o consumo, propriamente dito, outras variáveis, como características de personalidade, história de vida, avaliação das sensações eliciadas pelo uso como positivas, entre outras, quando combinadas, abrem espaço para que manutenção do uso se estabeleça. E assim por diante, se as experiências com a substância forem consideradas positivas, associadas aos processos de neuroadaptação, pode-se considerar a chance da ocorrência da dependência. A meu ver, não existe relação entre o aumento do número de experimentadores e a pouca eficácia dos modelos de tratamento.
NO
SEU LIVRO VOCÊ DEFENDE A UTILIZAÇÃO DAS TERAPIAS COGNITIVO-COMPORTAMENTAIS COMO
FORMA DE TRATAMENTO PARA OS DEPENDENTES QUÍMICOS. EXPLIQUE COMO E POR QUE
CHEGOU A ESSA CONCLUSÃO E SE FOI BASEADA EM SUAS EXPERIÊNCIAS NO ATENDIMENTO
CLÍNICO?
NEIDE - Há três décadas, estudos evidenciam a eficácia das terapias cognitivo-comportamentais no tratamento de transtornos psiquiátricos, entre eles o transtorno por uso de substâncias. Profissionais especializados e conscientes usam sempre, em seus consultórios, modelos de intervenções baseados em evidências científicas, e se forem bem treinados, e guardadas as diferenças entre os casos, podem confirmar as evidências apresentadas nos estudos.
NEIDE - Há três décadas, estudos evidenciam a eficácia das terapias cognitivo-comportamentais no tratamento de transtornos psiquiátricos, entre eles o transtorno por uso de substâncias. Profissionais especializados e conscientes usam sempre, em seus consultórios, modelos de intervenções baseados em evidências científicas, e se forem bem treinados, e guardadas as diferenças entre os casos, podem confirmar as evidências apresentadas nos estudos.
ESPECIFICAMENTE
NO TRATAMENTO DE DEPENDENTES QUÍMICOS, AS TÉCNICAS MAIS EFICIENTES SÃO AS
COGNITIVAS OU AS COMPORTAMENTAIS?
NEIDE - Ambas as técnicas são utilizadas e sua eficiência está relacionada com o treino que o terapeuta tem para usá-las. As terapias cognitivo-comportamentais reúnem um conjunto de terapias, que ora tem uma abordagem mais cognitiva e ora mais comportamental, dependendo da formação dos teóricos que as desenvolveram. As TCCs incluem terapias de: reestruturação cognitiva (enfoque mais cognitivo, reestruturação das crenças e dos pensamentos disfuncionais, busca de pensamentos e crenças alternativas), de treinamento de habilidades (enfoque mais comportamental, treino de habilidades, mas usando técnicas cognitivas, para que, além do treino propriamente dito da habilidade, possa haver mudança de comportamento duradoura). E, por fim, terapias de resolução de problemas (enfoque comportamental - seguir passos para a resolução sistemática de problemas). Este modelo teórico preconiza que as crenças e os pensamentos originados a partir delas determinam os sentimentos, comportamentos e reações fisiológicas. De modo que o objetivo primeiro desse modelo é auxiliar o paciente a identificar quais pensamentos disfuncionais, em relação a ele, ao mundo e às substâncias utilizadas podem ser modificados para que as emoções sejam mais estáveis e o comportamento deixe de gerar prejuízos.
NEIDE - Ambas as técnicas são utilizadas e sua eficiência está relacionada com o treino que o terapeuta tem para usá-las. As terapias cognitivo-comportamentais reúnem um conjunto de terapias, que ora tem uma abordagem mais cognitiva e ora mais comportamental, dependendo da formação dos teóricos que as desenvolveram. As TCCs incluem terapias de: reestruturação cognitiva (enfoque mais cognitivo, reestruturação das crenças e dos pensamentos disfuncionais, busca de pensamentos e crenças alternativas), de treinamento de habilidades (enfoque mais comportamental, treino de habilidades, mas usando técnicas cognitivas, para que, além do treino propriamente dito da habilidade, possa haver mudança de comportamento duradoura). E, por fim, terapias de resolução de problemas (enfoque comportamental - seguir passos para a resolução sistemática de problemas). Este modelo teórico preconiza que as crenças e os pensamentos originados a partir delas determinam os sentimentos, comportamentos e reações fisiológicas. De modo que o objetivo primeiro desse modelo é auxiliar o paciente a identificar quais pensamentos disfuncionais, em relação a ele, ao mundo e às substâncias utilizadas podem ser modificados para que as emoções sejam mais estáveis e o comportamento deixe de gerar prejuízos.
É
POSSÍVEL ADOTAR O TRATAMENTO COM AS TCCS EM CONJUNTO COM OUTRAS METODOLOGIAS OU
ELAS DEVEM SER UTILIZADAS DE FORMA ISOLADA?
NEIDE - Estudos evidenciam que as TCCs são eficazes tanto como monoterapia quanto como parte de um conjunto de abordagens, que tenha uma mesma meta em relação ao tratamento. Hoje, sabemos que na DQ (Dependência Química), um fenômeno complexo e de difícil manejo, quanto maior o número de abordagens associadas (desde que baseadas em evidências de eficácia), melhor o suporte para o paciente e melhores serão os desfechos. É comum associar a terapia de incremento para a motivação com terapia cognitivo-comportamental, por exemplo, pois na DQ, a motivação para a mudança tende a oscilar muito, de modo que precisamos, muitas vezes, retomar a questão da necessidade, importância e prontidão para a mudança, mesmo quando o tratamento já foi iniciado e o paciente, por exemplo, recaiu.
NEIDE - Estudos evidenciam que as TCCs são eficazes tanto como monoterapia quanto como parte de um conjunto de abordagens, que tenha uma mesma meta em relação ao tratamento. Hoje, sabemos que na DQ (Dependência Química), um fenômeno complexo e de difícil manejo, quanto maior o número de abordagens associadas (desde que baseadas em evidências de eficácia), melhor o suporte para o paciente e melhores serão os desfechos. É comum associar a terapia de incremento para a motivação com terapia cognitivo-comportamental, por exemplo, pois na DQ, a motivação para a mudança tende a oscilar muito, de modo que precisamos, muitas vezes, retomar a questão da necessidade, importância e prontidão para a mudança, mesmo quando o tratamento já foi iniciado e o paciente, por exemplo, recaiu.
EM
LINHAS GERAIS, QUAIS AS DIFERENÇAS BÁSICAS ENTRE AS TCCS E AS OUTRAS NO COMBATE
ÀS DEPENDÊNCIAS QUÍMICAS? É POSSÍVEL AFIRMAR QUE ELAS APRESENTAM RESULTADOS
MAIS EFETIVOS EM RELAÇÃO ÀS DEMAIS?
NEIDE - Várias teorias em Psicologia apresentam explicações válidas para o fenômeno da dependência química e algumas delas oferecem modelos de intervenção para o tratamento desse transtorno. As TCCs, por serem um conjunto de terapias de enfoque mais objetivo, de maior treinabilidade, que dispõem de um conjunto maior de manuais, talvez tenham sua inclusão mais facilitada em ensaios clínicos randomizados e, por isso, o crescente número de estudos utilizando a abordagem. Os estudos, quando comparam as TCCs com terapia motivacional, terapia tradicional, terapia interpessoal, ou terapia de manejo de contingências, em geral, apresentam os mesmos resultados no curso do tratamento em si, mas parece que as TCCs apresentam melhores resultados no pós-tratamento.
NEIDE - Várias teorias em Psicologia apresentam explicações válidas para o fenômeno da dependência química e algumas delas oferecem modelos de intervenção para o tratamento desse transtorno. As TCCs, por serem um conjunto de terapias de enfoque mais objetivo, de maior treinabilidade, que dispõem de um conjunto maior de manuais, talvez tenham sua inclusão mais facilitada em ensaios clínicos randomizados e, por isso, o crescente número de estudos utilizando a abordagem. Os estudos, quando comparam as TCCs com terapia motivacional, terapia tradicional, terapia interpessoal, ou terapia de manejo de contingências, em geral, apresentam os mesmos resultados no curso do tratamento em si, mas parece que as TCCs apresentam melhores resultados no pós-tratamento.
Apesar
do crescimento estatístico de dependentes químicos, a meu ver, não existe
relação entre o aumento do número de experimentadores e a pouca eficácia dos
modelos de terapêuticos
NA
SUA AVALIAÇÃO, AS TCCS SÃO A MELHOR INDICAÇÃO PARA TRATAR TODOS OS CASOS DE
DEPENDÊNCIA QUÍMICA OU ELAS FUNCIONAM MELHOR EM DETERMINADAS SITUAÇÕES
ESPECÍFICAS?
NEIDE - As TCCs funcionam para o tratamento de pacientes com DQ em todos os níveis de gravidade do transtorno, desde que o paciente esteja motivado para fazer uma mudança de comportamento. Daí a importância das terapias que auxiliam no fortalecimento da motivação para a mudança.
NEIDE - As TCCs funcionam para o tratamento de pacientes com DQ em todos os níveis de gravidade do transtorno, desde que o paciente esteja motivado para fazer uma mudança de comportamento. Daí a importância das terapias que auxiliam no fortalecimento da motivação para a mudança.
A
Entrevista Motivacional é um estilo de comunicação que auxilia no processo de
mudança e, quando o paciente está pronto, entramos com a TCC, cujo objetivo é
primeiro identificar quais as crenças (em geral, positivas) do paciente em
relação às substâncias utilizadas, o quanto estão baseadas em evidências de
realidade e quais seriam as crenças mais funcionais em relação a essas
substâncias. Por exemplo: "Maconha não é droga, fumar maconha não pega
nada" é uma crença que favorece o uso, ninguém que pensa que maconha não é
droga, se sentirá inclinado para interromper o uso. Se uma explicação
alternativa, mais funcional, for construída ("apesar do alívio que sinto
fumando maconha, sei que corro o risco de ter um surto psicótico se continuar
fumando") o comportamento de fumar pode ser significativamente alterado.
Mesmo nos casos em que houve prejuízo cognitivo mais grave podemos utilizar as
TCCs, focando mais nas técnicas de aprendizagem de comportamentos e nos
reforços que eles trazem quando emitidos.
O USO
DAS TCCS TAMBÉM APRESENTA BONS RESULTADOS NOS CASOS DO TRATAMENTO DE
DEPENDENTES DE DROGAS LÍCITAS, COMO O ÁLCOOL?
NEIDE - Sim, tanto para drogas lícitas quanto ilícitas, como também para o tratamento das dependências não químicas: compras, jogo, sexo e internet.
NEIDE - Sim, tanto para drogas lícitas quanto ilícitas, como também para o tratamento das dependências não químicas: compras, jogo, sexo e internet.
EM
QUE MEDIDA O TRATAMENTO COM TCC S AJUDA O DESENVOLVIMENTO EMOCIONAL DO PACIENTE
E EM RELAÇÃO AO SEU CONVÍVIO SOCIAL PERMANENTE?
NEIDE - Mesmo que o tratamento tenha seu foco na dependência de substâncias, o indivíduo nunca deixa de ser visto como um todo. Há que se oferecer, durante a terapia, ferramentas cognitivas que facilitem o autoconhecimento, e, com a reestruturação das crenças do indivíduo sobre si (quem sou, como sou, o que sou), sobre o mundo e sobre o outro, certamente haverá uma melhor estabilidade emocional, garantindo comportamentos mais funcionais em todas as áreas da vida do dependente. Um dos objetivos da TCC é que as habilidades treinadas (a partir da reestruturação do pensamento) sejam generalizadas para outras situações da vida do sujeito.
NEIDE - Mesmo que o tratamento tenha seu foco na dependência de substâncias, o indivíduo nunca deixa de ser visto como um todo. Há que se oferecer, durante a terapia, ferramentas cognitivas que facilitem o autoconhecimento, e, com a reestruturação das crenças do indivíduo sobre si (quem sou, como sou, o que sou), sobre o mundo e sobre o outro, certamente haverá uma melhor estabilidade emocional, garantindo comportamentos mais funcionais em todas as áreas da vida do dependente. Um dos objetivos da TCC é que as habilidades treinadas (a partir da reestruturação do pensamento) sejam generalizadas para outras situações da vida do sujeito.
EXISTEM
CASOS DE PESSOAS QUE SOFREM DE DEFICIÊNCIA DO SISTEMA DE RECOMPENSA CEREBRAL,
OU SEJA, APRESENTAM DIFICULDADES, BIOLOGICAMENTE DETERMINADAS, PARA OBTER
PRAZER EM ATIVIDADES DO COTIDIANO E, POR ISSO, TENDEM A BUSCÁ-LO EM PRÁTICAS DE
RISCO, COMO USO DE DROGAS. O TRATAMENTO COM AS TCCS TAMBÉM É INDICADO PARA
ESSAS SITUAÇÕES?
NEIDE - Sim, à medida que aumentamos o leque de opções de atividades que nos são prazerosas, e, ao executá-las, recebemos o reforço positivo, ou seja, constatamos a existência do prazer, nosso cérebro registrará esta sensação e passará a fazer parte do nosso repertório de possibilidades de prazer. A TCC auxilia o paciente a identificar essas opções, que ainda não foram consideradas por ele e, por isso, não fazem parte de seu repertório.
NEIDE - Sim, à medida que aumentamos o leque de opções de atividades que nos são prazerosas, e, ao executá-las, recebemos o reforço positivo, ou seja, constatamos a existência do prazer, nosso cérebro registrará esta sensação e passará a fazer parte do nosso repertório de possibilidades de prazer. A TCC auxilia o paciente a identificar essas opções, que ainda não foram consideradas por ele e, por isso, não fazem parte de seu repertório.
O uso
de diários de automonitoramento, de registros de pensamentos e sentimentos com
relação a atividades prazerosas auxilia muito nessa tarefa.
ESSE
MÉTODO TENDE A DEIXAR O TRATAMENTO MAIS RÁPIDO OU NECESSITA DE UMA DURAÇÃO
MAIOR PARA OBTER RESPOSTAS AFIRMATIVAS?
NEIDE - As TCCs têm o caráter de serem breves. Existem casos que precisam de mais tempo de acompanhamento. No caso da DQ, sabemos que, quanto mais tempo o paciente ficar aderido ao tratamento (no follow-up), melhores os resultados. Tende-se a atender mais intensamente no início do tratamento e espaçando as sessões na medida em que as metas são atingidas. Outro objetivo das TCCs é que o paciente seja seu próprio terapeuta.
NEIDE - As TCCs têm o caráter de serem breves. Existem casos que precisam de mais tempo de acompanhamento. No caso da DQ, sabemos que, quanto mais tempo o paciente ficar aderido ao tratamento (no follow-up), melhores os resultados. Tende-se a atender mais intensamente no início do tratamento e espaçando as sessões na medida em que as metas são atingidas. Outro objetivo das TCCs é que o paciente seja seu próprio terapeuta.
As
TCCs funcionam para o tratamento em todos os níveis de gravidade do transtorno,
desde que ele esteja motivado para fazer uma mudança de comportamento
O
RESULTADO POSITIVO NO PACIENTE SE DEVE, ESSENCIALMENTE, À FORMA COM QUE AS TCCS
SÃO ADOTADAS OU À MANEIRA COM QUE O USUÁRIO DE DROGA RECONHECE E ADERE AO
TRATAMENTO?
NEIDE - O tratamento da DQ é difícil e precisamos deixar claro o que entendemos por resultado positivo. Nem sempre o paciente atinge aquilo que era a meta principal do tratamento, mas eu não diria que nada mudou. Não diria que o paciente não aderiu ou que o profissional não foi bom. A mudança acontece de forma diferente para diferentes pessoas. A cada intervenção, o paciente muda um pouco, até que num determinado momento, ele está pronto para mudar totalmente seu comportamento.
NEIDE - O tratamento da DQ é difícil e precisamos deixar claro o que entendemos por resultado positivo. Nem sempre o paciente atinge aquilo que era a meta principal do tratamento, mas eu não diria que nada mudou. Não diria que o paciente não aderiu ou que o profissional não foi bom. A mudança acontece de forma diferente para diferentes pessoas. A cada intervenção, o paciente muda um pouco, até que num determinado momento, ele está pronto para mudar totalmente seu comportamento.
HÁ
ALGUMA DIFERENÇA NO TRATAMENTO QUANDO O PACIENTE ESTÁ NO INÍCIO DA TERAPIA EM
RELAÇÃO AOS CASOS DE RECAÍDA?
NEIDE - A recaída é um evento que pertence aos transtornos psiquiátricos, de um modo geral, e deverá ser considerada durante todo o processo de tratamento. A forma de pensar sobre as substâncias, as expectativas a respeito dos efeitos do uso, a sensação de quanto se é forte (autoeficácia) para fazer a mudança e mantê-la são mais significativas em relação à retomada do processo de mudança, do que o momento em que esta ocorre durante o tratamento.
NEIDE - A recaída é um evento que pertence aos transtornos psiquiátricos, de um modo geral, e deverá ser considerada durante todo o processo de tratamento. A forma de pensar sobre as substâncias, as expectativas a respeito dos efeitos do uso, a sensação de quanto se é forte (autoeficácia) para fazer a mudança e mantê-la são mais significativas em relação à retomada do processo de mudança, do que o momento em que esta ocorre durante o tratamento.
EXISTEM
VÁRIAS TÉCNICAS DE TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL, COMO A TERAPIA DIALÉTICA
COMPORTAMENTAL, QUE, RECENTEMENTE, PASSOU A SER UTILIZADA EM DEPENDENTES
QUÍMICOS. TODAS SÃO EFICIENTES NESSE SENTIDO?
NEIDE - Várias abordagens se mostram eficazes no tratamento da DQ. O importante é que o profissional conheça profundamente a abordagem sob cuja ótica ele compreenderá a dependência (dominando o uso de técnicas do modelo), conheça o transtorno por uso de substâncias (seja um especialista na área) e conheça as interfaces desse transtorno com outros da área de saúde mental.
NEIDE - Várias abordagens se mostram eficazes no tratamento da DQ. O importante é que o profissional conheça profundamente a abordagem sob cuja ótica ele compreenderá a dependência (dominando o uso de técnicas do modelo), conheça o transtorno por uso de substâncias (seja um especialista na área) e conheça as interfaces desse transtorno com outros da área de saúde mental.
QUAIS
AS PRINCIPAIS FERRAMENTAS PARA SE TER ACESSO AO MUNDO DO PACIENTE E, ASSIM,
CONSEGUIR UMA EFETIVA MUDANÇA EM SEU COMPORTAMENTO? AS TCCS OFERECEM
ALTERNATIVAS COMPORTAMENTAIS AOS VICIADOS?
NEIDE - Cada abordagem teórica tem, em seu arcabouço, um conjunto de técnicas que, uma vez aplicadas, facilitam o autoconhecimento. Na terapia cognitiva, o processo de conceituação cognitiva, que é construído e reformulado à medida que o processo terapêutico acontece, é uma ferramenta compartilhada entre terapeuta e paciente, que permite o acesso ao mundo interno do paciente, a avaliação do conteúdo deste mundo e a reestruturação daquilo que não é funcional. A mudança do comportamento tende a ser mais duradoura quando acontece de maneira integralizada, ou seja, mudando-se de dentro para fora. Não simplesmente com o treino de um novo comportamento, porque este é mais socialmente aceito do que o anterior.
NEIDE - Cada abordagem teórica tem, em seu arcabouço, um conjunto de técnicas que, uma vez aplicadas, facilitam o autoconhecimento. Na terapia cognitiva, o processo de conceituação cognitiva, que é construído e reformulado à medida que o processo terapêutico acontece, é uma ferramenta compartilhada entre terapeuta e paciente, que permite o acesso ao mundo interno do paciente, a avaliação do conteúdo deste mundo e a reestruturação daquilo que não é funcional. A mudança do comportamento tende a ser mais duradoura quando acontece de maneira integralizada, ou seja, mudando-se de dentro para fora. Não simplesmente com o treino de um novo comportamento, porque este é mais socialmente aceito do que o anterior.
VOCÊ
ACREDITA QUE A MELHOR ABORDAGEM DAS TCCS DEVE SER INDIVIDUAL OU EM GRUPOS DE
PACIENTES DEPENDENTES QUÍMICOS?
NEIDE - Estudos evidenciam que as TCCs funcionam para diferentes populações (mulheres, idosos, adolescentes) individualmente e em grupo. O importante, quando tratamos pacientes DQ em grupo, é tomarmos cuidado para formar grupos mais homogêneos, separando por idade, por gênero e por substância utilizada.
NEIDE - Estudos evidenciam que as TCCs funcionam para diferentes populações (mulheres, idosos, adolescentes) individualmente e em grupo. O importante, quando tratamos pacientes DQ em grupo, é tomarmos cuidado para formar grupos mais homogêneos, separando por idade, por gênero e por substância utilizada.
DURANTE
O PROCESSO DE TRATAMENTO, AS FAMÍLIAS AJUDAM OU ATRAPALHAM? E COMO FUNCIONAM AS
TCCS EM CASOS DE CODEPENDÊNCIA FAMILIAR?
NEIDE - A família é considerada o maior fator de proteção, assim como o principal fator de risco para o abuso e dependência de substâncias. O tratamento das famílias com as TCCs também terá como objetivo principal mudar a forma de significar a dependência, o dependente, o tratamento e as possibilidades de melhora do familiar dependente por parte de todo o núcleo familiar. As TCCs, no tratamento familiar, focam a reestruturação das crenças e dos pensamentos na identificação das distorções cognitivas que impedem a ocorrência de estados emocionais mais estáveis e comportamentos mais funcionais, bem como na melhoria das habilidades de comunicação (ou no desenvolvimento destas habilidades) e também na aceitação e solução dos problemas decorrentes do uso de substâncias. A prática da assertividade é ferramenta importante no tratamento das famílias. É comum que a família se afaste do processo de tratamento em duas situações: quando o paciente não adere (a família pensa que se ele, que é dependente, não vem ao tratamento, porque a família tem de vir) ou quando o paciente melhora (se o paciente já parou de usar, então não precisamos mais do tratamento - nem nós e, muitas vezes, nem ele). Como se vê, o pensamento determina o comportamento de se afastar do tratamento, e aí a chance da recaída, por falta de suporte, pode ser uma possibilidade. Estudos evidenciam que quanto maior a aderência da família ao tratamento, e consequente mudança de comportamento, maior a chance de aderência por parte do paciente.
NEIDE - A família é considerada o maior fator de proteção, assim como o principal fator de risco para o abuso e dependência de substâncias. O tratamento das famílias com as TCCs também terá como objetivo principal mudar a forma de significar a dependência, o dependente, o tratamento e as possibilidades de melhora do familiar dependente por parte de todo o núcleo familiar. As TCCs, no tratamento familiar, focam a reestruturação das crenças e dos pensamentos na identificação das distorções cognitivas que impedem a ocorrência de estados emocionais mais estáveis e comportamentos mais funcionais, bem como na melhoria das habilidades de comunicação (ou no desenvolvimento destas habilidades) e também na aceitação e solução dos problemas decorrentes do uso de substâncias. A prática da assertividade é ferramenta importante no tratamento das famílias. É comum que a família se afaste do processo de tratamento em duas situações: quando o paciente não adere (a família pensa que se ele, que é dependente, não vem ao tratamento, porque a família tem de vir) ou quando o paciente melhora (se o paciente já parou de usar, então não precisamos mais do tratamento - nem nós e, muitas vezes, nem ele). Como se vê, o pensamento determina o comportamento de se afastar do tratamento, e aí a chance da recaída, por falta de suporte, pode ser uma possibilidade. Estudos evidenciam que quanto maior a aderência da família ao tratamento, e consequente mudança de comportamento, maior a chance de aderência por parte do paciente.
As
TCCs têm caráter breve. Existem casos que precisam de mais tempo de
acompanhamento. Em dependência química, quanto mais tempo de adesão ao
tratamento, melhor
EM
FUNÇÃO DO AUMENTO DO NÚMERO DE DEPENDENTES QUÍMICOS NO BRASIL, VOCÊ ACHA QUE O
MODELO MATRIX (PRÁTICA QUE INTEGRA TCC, FAMÍLIA E PREVENÇÃO DE RECAÍDA),
IMPLANTADO NOS ESTADOS UNIDOS, PODE SER INCORPORADO AQUI COM EFICIÊNCIA?
FUNCIONA EM NOSSA REALIDADE CULTURAL?
NEIDE - Sem dúvida, pode. Feitas as devidas adaptações para a nossa cultura, estudos evidenciam que, quando se associam as TCCs com abordagens voltadas para a família, a adesão e desfechos são melhores. Os tratamentos voltados para a prevenção da recaída visam auxiliar o paciente e seus familiares a identificarem as situações de perigo, que colocam em risco a mudança (do paciente, no que diz respeito ao uso, e da família, no que diz respeito aos comportamentos nas relações com o paciente). Volto a evidenciar que o tratamento mais eficaz é aquele que é desenhado para o paciente, atendendo suas necessidades específicas. A combinação de várias abordagens permite acolhê-lo de maneira mais completa, mas não deve engessar a postura nem do profissional nem do serviço, de forma que ele poderá aproveitar de cada abordagem exatamente o quanto precisa dela ou da combinação dela com outras.
NEIDE - Sem dúvida, pode. Feitas as devidas adaptações para a nossa cultura, estudos evidenciam que, quando se associam as TCCs com abordagens voltadas para a família, a adesão e desfechos são melhores. Os tratamentos voltados para a prevenção da recaída visam auxiliar o paciente e seus familiares a identificarem as situações de perigo, que colocam em risco a mudança (do paciente, no que diz respeito ao uso, e da família, no que diz respeito aos comportamentos nas relações com o paciente). Volto a evidenciar que o tratamento mais eficaz é aquele que é desenhado para o paciente, atendendo suas necessidades específicas. A combinação de várias abordagens permite acolhê-lo de maneira mais completa, mas não deve engessar a postura nem do profissional nem do serviço, de forma que ele poderá aproveitar de cada abordagem exatamente o quanto precisa dela ou da combinação dela com outras.
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