Liberação do tráfico de drogas à
vista.
O
uso de drogas não é considerado crime. Em obediência ao princípio da
alteridade, a lei penal não pode punir aquele que só faz mal a si mesmo. Pela mais
abalizada doutrina penal, a conduta do infrator só é punida quando expuser a
risco interesse de terceiros. Não se pune quem tenta se suicidar ou quem se
tortura. Pela mesma razão, o usuário, que prejudica apenas a própria saúde, não
comete infração penal.
Diferentemente
do uso, constitui crime a conduta de adquirir ou portar entorpecente para usar
depois, uma vez que, nesse caso, há o risco social de circulação da droga,
expondo a saúde de terceiros. Esse raciocínio correto do legislador está
prestes a ser modificado para pior.
A
comissão especial que elabora o anteprojeto do novo Código Penal opinou no
último dia 28 de maio pela descriminalização do porte ou aquisição de drogas,
quando a quantidade representar, no máximo, o equivalente a cinco dias de consumo.
Nesta hipótese, presume-se que o sujeito é apenas usuário. Ao que parece, a lei
pretende fazer um corte arbitrário, fixando previamente o limite até o qual
poderá ser portada ou adquirida a substância, sem que configure crime.
As
quadrilhas voltadas ao narcotráfico já têm a estratégia pronta e preparada:
basta distribuir a quantidade permitida por lei por meio de pequenos
traficantes, que atuarão como tentáculos da organização. Ao serem
surpreendidos, presumir-se-á que eles são usuários e não mercadores de drogas,
não respondendo por crime algum. Uma cautela a mais dos chefes das quadrilhas:
é melhor recrutar pessoas ainda sem antecedentes criminais para trabalhar com o
tráfico, a fim de que pareçam mesmo “inocentes” usuários e não sejam incomodadas
pelo sistema criminal.
Será
uma grande vitória do tráfico de drogas. Os traficantes, agora, só esperam que
esse sonho de impunidade vire realidade.
Fernando
Capez é procurador de Justiça licenciado, professor de direito penal e deputado
estadual pelo PSDB em SP.
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