sexta-feira, 15 de junho de 2012



Liberação do tráfico de drogas à vista.
 O uso de drogas não é considerado crime. Em obediência ao princípio da alteridade, a lei penal não pode punir aquele que só faz mal a si mesmo. Pela mais abalizada doutrina penal, a conduta do infrator só é punida quando expuser a risco interesse de terceiros. Não se pune quem tenta se suicidar ou quem se tortura. Pela mesma razão, o usuário, que prejudica apenas a própria saúde, não comete infração penal.
Diferentemente do uso, constitui crime a conduta de adquirir ou portar entorpecente para usar depois, uma vez que, nesse caso, há o risco social de circulação da droga, expondo a saúde de terceiros. Esse raciocínio correto do legislador está prestes a ser modificado para pior.
A comissão especial que elabora o anteprojeto do novo Código Penal opinou no último dia 28 de maio pela descriminalização do porte ou aquisição de drogas, quando a quantidade representar, no máximo, o equivalente a cinco dias de consumo. Nesta hipótese, presume-se que o sujeito é apenas usuário. Ao que parece, a lei pretende fazer um corte arbitrário, fixando previamente o limite até o qual poderá ser portada ou adquirida a substância, sem que configure crime.
As quadrilhas voltadas ao narcotráfico já têm a estratégia pronta e preparada: basta distribuir a quantidade permitida por lei por meio de pequenos traficantes, que atuarão como tentáculos da organização. Ao serem surpreendidos, presumir-se-á que eles são usuários e não mercadores de drogas, não respondendo por crime algum. Uma cautela a mais dos chefes das quadrilhas: é melhor recrutar pessoas ainda sem antecedentes criminais para trabalhar com o tráfico, a fim de que pareçam mesmo “inocentes” usuários e não sejam incomodadas pelo sistema criminal.
Será uma grande vitória do tráfico de drogas. Os traficantes, agora, só esperam que esse sonho de impunidade vire realidade.
Fernando Capez é procurador de Justiça licenciado, professor de direito penal e deputado estadual pelo PSDB em SP.

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