sábado, 20 de abril de 2013


Especialistas criticam eficácia de programa de redução de danos da Prefeitura de BH, que incentiva os dependentes a usar substâncias como álcool e tabaco para se livrar da pedra.
Jornal O Estado de Minas
Sandra Kiefer
O modelo da redução de danos proposto pela Prefeitura de Belo Horizonte, com incentivo ao uso de drogas lícitas por dependentes, como alternativa à internação compulsória adotada em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, divide especialistas da área. Como mostrou ontem reportagem do Estado de Minas, na capital mineira a administração defende a substituição progressiva do uso do crack por substâncias como álcool, tabaco, opiáceos e remédios controlados, até o paciente atingir a abstinência completa.
Robert William, presidente da organização não governamental Defesa Social, voltada para o atendimento a dependentes químicos, posiciona-se contra a política defendida pela PBH. “Atendi esta semana o caso de G., de 34 anos, usuária de crack há cinco anos. Ela contou que estava sendo atendida no Cersam-AD e que não quer ir mais para lá. Disse que as pessoas usam droga lá dentro e que tem até um estande com distribuição gratuita de cigarros. Falou que quer ajuda para se internar, mas não encontra vaga em BH”, afirmou. Segundo ele, no trabalho de abordagem da entidade nas ruas, os usuários de crack manifestam vontade de se internar, com raras exceções.
Para o psiquiatra forense Paulo Repsold, que acumula a diretoria financeira da Associação Médica de Minas Gerais e da Associação Mineira de Psiquiatria, a redução de danos não deveria ser aplicada ao crack, que está longe de ser uma droga consumida socialmente. “Com o crack, não há uso social, como aquele cara que toma sua cervejinha no fim de semana. A pessoa que usa 10 pedras não vai se contentar com uma só. Estou falando do dependente químico, que perde a vontade própria e se torna escravo da droga, com deterioração física e mental”, adverte.
Repsold avalia que as ações não estão ocorrendo de acordo com a rapidez e o tamanho que merece a população de BH. “Estamos travados diante de uma discussão ideológica, com pouco rigor científico”, critica. Para ele, é simples acabar com a epidemia do crack. “Não entendo por que nada acontece. É simples criar enfermarias, leitos em hospitais, fechar convênios com o terceiro setor. Mas é preciso gastar dinheiro, não dá para fazer uma omelete sem quebrar os ovos”, completa.
Para o administrador Marcelo Teixeira, secretário municipal de Saúde, Belo Horizonte não está paralisada em relação ao enfrentamento do crack, apesar de ainda haver entraves para a implantação do programa Crack: É Possível Vencer, pactuado com o governo federal. Segundo ele, a verba repassada pelo Ministério da Saúde a título de custeio de um Cersam-AD gira em torno de R$ 75 mil mensais, o equivalente a 29% dos R$ 260 mil necessários para as despesas. “Para decidir pela implantação de mais um Cersam-AD na capital, a prefeitura precisa assumir o restante dos gastos.”
Um deles, o Cersam-AD do Barreiro, será inaugurado este sábado, mas chegou a ser anunciado como certo para entrar em funcionamento no ano passado. Segundo Marcelo Teixeira, já estava tudo pronto para a inauguração da unidade, mas ela teve de ser adiada devido à campanha pela reeleição do prefeito Marcio Lacerda (PSB). “Cheguei a consultar a Procuradoria do Município e havia o risco de tornar o prefeito inelegível se fôssemos contratar novos profissionais da área de saúde no segundo semestre.”
Em 29 de junho de 2012, a prefeitura lançou o Projeto Recomeço, adequando-se ao programa do governo federal e ao projeto Aliança pela Vida, do estado. O projeto municipal prevê a inauguração de mais três Cersams-AD na capital. Segundo a Secretaria Municipal de Saúde, em junho virá o Cersam-AD da região Nordeste, que funcionará em local estratégico, nas proximidades da cracolândia da Lagoinha.

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