quinta-feira, 10 de abril de 2014



MAS QUE DROGA, SENADOR CRISTOVAM BUARQUE!


"Fui indicado pela presidência da CDH - Comissão de Direitos Humanos, para relatar proposta de iniciativa popular que visa legalizar o uso de maconha. Embora seja um tema no qual sou leigo, não vou fugir da indicação, temendo a polêmica em torno dela. Vou aprofundar o assunto através de audiências públicas e debates, inclusive aqui. Só me recusaria se o tema fosse irrelevante, mas ele é relevante. Quero analisar em primeiro lugar o risco de que a legalização possa ampliar o consumo; depois, se há realmente vantagem científica e medicinal; ainda mais, o impacto da legalização na redução de violência; também quero saber se o sentimento nacional deseja está legalização ou ainda não estaria preparado. Gostaria de ouvir sua opinião". 
Cristovam Buarque.
 Senador: conheço o senhor do MEC e respeito o seu trabalho como educador, e como político honesto; mas ninguém deveria aceitar –e menos ainda o senhor!– uma responsabilidade tamanha sem ter conhecimento e opinião formada. Vou lhe dar a minha opinião, já que pediu:
 Os argumentos hoje para legalizar a maconha são:
a) uso medicinal, b) acabar com o tráfico, c) arrecadar impostos para a saúde e educação.
 Sobre o primeiro (a) acho simples de responder: ninguém se preocupa com o uso medicinal do ópio (já houve uma guerra na China porque a Inglaterra queria impor a venda desta droga a toda a nação chinesa) que, já sabemos, é aplicada na morfina. Ninguém se opõe ao uso medicinal de qualquer planta, incluindo aí a maconha. O princípio ativo precisa ser sintetizado para o uso medicinal. O fumo não é o uso da síntese.
 Sobre o argumento (b) de "acabar com o tráfico ilegal" (fazendo-o legal), vamos ver se entendi: uma vez legalizada a maconha, o traficante troca a Uzi e os chinelos por um terno bem cortado, uma gravata azul, um Audi, e vai morar no Morumbi; entendi. 
Ou será que o traficante continua a traficar as outras drogas ilegais? e aí vem a campanha para legalizar todas as drogas e o problema fica resolvido: os traficantes se aposentam, os lucros passam a ter CNPJ e a emitir NF e pagar impostos. 
 Ok, e os dependentes químicos? os que começam com álcool-maconha e seguem com cocaína e crack (sem por isto deixar o cannabis e a pinga, claro), quando acaba a cota "farmacêutica" com receita...o que fazem? esperam girar o mês para pegar outra receita de ...40 gramas? ou será que quem é viciado não vai achar pouco? será que não vai querer ir para um mercado paralelo para aqueles que estouraram a cota "medicinal" e/ou "recreativa"? 
Opa, juntando as pontas: não será que os traficantes de hoje, ciumentos dos homens de terno e gravatinha cor de rosa, não vão decidir vender essa droga que vai faltar todo mês ao viciado? será que eles não vão explorar esse "paralelo"?
 Por último: sabia, senador, que só no estado de São Paulo, há 600 grupos com mais de 100 famílias cada um, em média, que vivem o drama diário de ter um dependente químico em casa (ou nas ruas)? 
Sabia que 18% a 22% dos que experimentam qualquer psicotrópico acabam viciados? Claro: os que querem a maconha "recreativa" em geral pertencem a uma classe média "intelectual" que pensam que nenhum entre eles vai parar nas cracolândias da vida só por causa de um par de baseados na sexta à noite e outros quatro ou seis entre sábado e domingo. Mas...sabia que na cracolândia –só conheço bem a de SPaulo– há muitos dependentes que vieram da classe média? Há muito ex-homem de negócios que troca de a pedaços a sua Hilux por pedras de crack? 
E sabia que muitos, quase todos eles, começaram pela maconha? Bom, mas quem quer "recreação" não está nem aí com esses detalhes. 
 Mas eu sou chato e insisto: sabia que de 20 a 30% dos dependentes compartilham alguma comorbidade? Isto é, dito de um  odo mais simples, são bipolares, depressivos, esquizofrênicos ou border-lines? Esses distúrbios mentais são controláveis, sim; mas quando se somam à droga (psicotrópicos vários, entre os quais a cannabis) os resultados são catastróficos? vide os noticiários de cada semana desde sempre: cineasta morto a facadas pelo filho, esquizofrênico e usuário de drogas....Isto se resolve "liberando" a maconha? 
 Mas se a maconha, a cocaína e o crack estão já liberados faz tempo, senador! Passe à tardinha pelas ruas Augusta, avenida Paulista ou na Frei Caneca, e verá que ninguém inibe a venda e o consumo in situ de qualquer droga. Mais ainda: convido o senhor a visitar a Cracolândia de São Paulo –onde dois grupos de jovens trabalham com a PMSP e a secretaria da saúde do estado, e onde pessoalmente trabalho com os familiares dos usuários de crack– e perguntar a esses pobres seres humanos o que acham de liberar a maconha. Convido a ler os relatórios dos jovens que abordam os dependentes sem teto e sabem que a maconha é, junto com o cigarro e o álcool (legais ambos) a porta de entrada desse longo caminho sem volta da cocaína e o crack. Convido ainda a visitar e trocar ideias com alguma das várias irmandades atrás de siglas como os A.A, N.A, Amor Exigente e outras que apoiam as famílias e ao dependente em recuperação para se livrar do flagelo das drogas.
 Isto não é moral nem menos ainda moralina: não critico os costumes, mas também não sou a favor do "quem quiser que use e faça do seu cérebro o que bem entender". Por isso tenho certeza que um político como o senhor, honesto, que não é liberal, que não advoga pelo egoísmo do nosso capitalismo selvagem, vai pensar melhor no assunto.
 E permita-me, já sobre o final, uma ironia com quem acha que a liberação da maconha vai resolver tudo o que hoje está errado: será que, se aprovada a lei, o PCC vai recolher as Uzis e entregar pijamas para os seus soldados ficarem assistindo a Globo? será que os grandes traficantes vão fazer biquinho porque a aliança de Soros-FHC-Philips Morris tirou os lucros deles e vão entrar todos na Assembleia de Deus, ou vão virar Hare Krishna? Será que os dependentes químicos que fumam entre 10 e 20 baseados por dia, vão ficar quietos assim que ultrapassarem a sua cota farmacêutica de 40 gramas, e ninguém vai oferecer nada "por fora" a eles? Os impostos e taxas que são mal aplicados hoje, vão passar a ser "dinamarquesamente" aplicados em saúde e educação? As cracolândias vão desaparecer pelos efeitos medicinais do cannabis? As PMs vão se autodissolver e deixar de reprimir bêbados que se embriagam legalmente e vão passar a ajudar as velhinhas a travessar o farol? Onde fica a entrada desse espelho, Alice?
 A entrada que não é espelho no país das maravilhas é o que o senhor, senador Buarque, vem preconizando há décadas: na educação em geral e na educação no combate às drogas, especificamente; na saúde pública para o dependente químico, entendendo a droga como um desencadeante de múltiplas doenças, físicas e mentais.
Nem mais repressão, nem liberação: mudança de foco; centrar no que interessa: educar o soberano, como dizia o velho liberal argentino, Sarmiento, quando o liberalismo ainda era progressista.
Um abraço,
 Javier Villanueva, São Paulo, 18 de fevereiro de 2014.

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